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As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

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os cientistas se tornam autores de best-sellers, militantes, personagens midiáticos, e como e<br />

quando o “público leigo” contribui na produção de conhecimento científico e tecnológico, não<br />

apenas disponibilizando seus “saberes locais”, mas participando na produção de dados e nas<br />

práticas de decisão da “ciência oficial” (Bucchi, 2006: cap. 3).<br />

Junto com a enunciação da inexorabilidade, a <strong>tecnociência</strong> contemporânea narra a fábula<br />

de uma ciência, de uma tecnologia e de dinâmicas de mercado que se fazem também nas<br />

praças e nos cafés, ou na arena acalorada da luta social. A aceleração tecnocientífica, de<br />

acordo com uma versão atual de seu auto-retrato, é facilitada ou dificultada sob os holofotes<br />

da mídia. É decidida também por meio da interação com um público composto por não-<br />

cientistas, não-técnicos, não-empresários. Há uma interação crescente, uma co-produção de<br />

sentido e uma captura mútua oriundas de uma multiplicidade de lugares. Ao mesmo tempo em<br />

que esquemas piramidais e top-down parecem moldar uma parte importante de suas práticas e<br />

redes sociais, a <strong>tecnociência</strong> também retrata a si mesma por meio de esquemas tentaculares, de<br />

osmoses, de discursos polifônicos, multicêntricos, de práticas baseadas em trocas e<br />

transfusões, em transversalidades e retroalimentações. Junto com um saber/poder que parece<br />

irradiar-se de cima para baixo, produzido no monte Olimpo 206 , externo e estranho à escolha<br />

social como o de um soberano imperial, também há uma microfísica do poder (e dos saberes)<br />

em que a gestão dos produtos tecnológicos e até a produção do conhecimento científico<br />

são feitas em co-participação.<br />

A configuração atual do dispositivo é facilmente observada, seja na formação discursiva,<br />

seja através de uma exploração das práticas de produção, apropriação e gestão da <strong>tecnociência</strong>.<br />

Na ordem discursiva, os procedimentos de seleção e rejeição parecem hoje deixar passar<br />

enunciados que, no século XIX (e no começo do XX), teriam sido segregados como falsos e<br />

irracionais. Junto com os elementos do entrelaçamento clássico analisado no capítulo 3<br />

(inevitabilidade da técnica, da ciência, do mercado, a partir da imanência, da aceleração, da<br />

novidade, da maravilha, do “império”, dos fatos, das “luzes” etc.) há novos refrãos e leitmotifs<br />

(Figura 29 abaixo e, para o exame detalhado, Par. 4.7).<br />

206 Por volta de 1930, William Laurence, jornalista científico do New York Times, traçava um auto-retrato heróico de<br />

sua profissão: “Autênticos descendentes de Prometeu” – dizia – “os escritores de ciência pegam o fogo do Olimpo<br />

científico (os laboratórios e as universidades) e o trazem lá em baixo, para o povo” (Nelkin, 1987). Esta imagem do<br />

conhecimento científico situado num Olimpo, afastado da possibilidade de alcance das pessoas “comuns” (e a imagem<br />

do divulgador como mediador) foi predominante a partir do final do século XIX, e foi reproduzida e reforçada pelos<br />

divulgadores científicos até, pelo menos, a década de 1990.<br />

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