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As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

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...“Apelidado de ‘O Monstro’, animal tinha 15 metros e viveu há 150 milhões de anos. Espécie foi<br />

apresentada à imprensa antes de seu estudo ser concluído, o que é anormal; objetivo é obter fundos<br />

para mais pesquisas.<br />

Um grupo de cientistas noruegueses sem dinheiro para continuar suas pesquisas perdeu o pudor e<br />

resolveu divulgar resultados preliminares de uma descoberta literalmente grande: os fósseis de um<br />

réptil marinho extinto de 15 metros de comprimento, provavelmente o maior já encontrado. Antes<br />

mesmo de ganhar um nome científico e uma descrição formal numa publicação acadêmica – algo<br />

obrigatório para validar uma descoberta –, o animal já tem fotos divulgadas na internet e até um apelido<br />

carinhoso: ‘O Monstro’. Ele é um plesiossauro, membro de um grupo de animais que viveu na era dos<br />

dinossauros, há 150 milhões de anos. [...] A logística de um trabalho de campo no deserto ártico é<br />

complicada: exige vôos de helicóptero, acampamentos no meio do nada (sob constante risco de ataque de<br />

ursos polares) – e muito, muito dinheiro. ‘Precisamos de US$ 200 mil para a próxima temporada de<br />

campo’, afirmou Hurum. Para amolecer o coração dos financiadores, o cientista e seus colegas [...]<br />

resolveram divulgar à imprensa as fotos do ‘Monstro’. Outros cientistas torcem o nariz para a estratégia.<br />

[...] Hurum diz que o fim justifica os meios. ‘O valor científico de uma jazida fossilífera dessas é<br />

simplesmente incrível’...<br />

(Folha de S. Paulo, 28/2/2008)<br />

4.4.2 A mídia como lugar de proeminência<br />

Outro uso “científico” da mídia, condenado mas cada vez mais freqüente entre cientistas de<br />

áreas em extrema aceleração (sobretudo biomedicina e tecnologias de ponta) consiste em fazer<br />

com que o julgamento dos pares (peer-review) sobre novas pesquisas, descobertas e invenções<br />

seja precedido pela propaganda. Mesmo que, mais tarde, os dados resultem sem valor ou a<br />

teoria pareça não ter embasamento, a fama chega e, com ela, possível financiamento para<br />

outras pesquisas, ou novas possibilidades de carreira. Foi esse o caso da fusão nuclear “a frio”,<br />

que agitou a comunidade dos físicos em 1989. Os químicos Martin Fleischmann e Stanley<br />

Pons, da Universidade de Utah, anunciaram o feito, absolutamente extraordinário, de que<br />

teriam conseguido produzir uma reação de fusão nuclear controlada praticamente à<br />

temperatura ambiente. O sonho de ter energia ilimitada para a humanidade parecia estar se<br />

realizando. Os cientistas decidiram comunicar por meio de uma coletiva de imprensa e não,<br />

como praxe na ciência acadêmica, por intermédio da aceitação do trabalho numa revista<br />

especializada (Lewenstein, 1995). O trabalho deles foi logo demolido pelas críticas<br />

internacionais e não deu lugar a publicações importantes. Mas o escândalo garantiu a ambos<br />

alguns canais para fazer dinheiro.<br />

O caso de Fleischmann e Pons não é uma exceção. A explosão calculada, instrumental, de<br />

bombas midiáticas – como no caso da ovelha Dolly ou da clonagem humana (falsa) por parte<br />

do coreano Hwang – é usada por cientistas e instituições para fortalecer sua proeminência no<br />

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