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As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

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midiática. Quando os cientistas fazem algo que tem uma valência política ou quando suas<br />

afirmações pautam, legitimam (ou preocupam) os políticos, quase sempre a mídia (e não<br />

apenas as revistas especializadas, ou o Parlamento) é o palco do debate.<br />

Quando, em 1997, uma ovelha nasceu sem ter um pai, num laboratório até então<br />

desconhecido perto de Edimburgo, o fato foi retratado como símbolo de progresso e como<br />

inquietante transgressão moral. Mas, junto com a máquina midiática, se moveu um grande<br />

show político internacional: primeiros-ministros e presidentes foram obrigados a se posicionar,<br />

nas primeiras páginas dos diários do mudo inteiro, sobre o significado e as potencialidades<br />

abertas por Dolly e de quem seriam as responsabilidades por futuras aplicações da clonagem<br />

de mamíferos (Jasanoff, 2006: p. 15 segs.). Analogamente, a declaração (bastante<br />

aproximativa) de que o seqüenciamento do genoma humano tinha sido completado<br />

contemporaneamente pelo consórcio público internacional e a empresa Celera Genomics de<br />

Craig Venter, não foi feita pelos protagonistas, mas pelo primeiro-ministro britânico e o<br />

presidente dos Estados Unidos (veja cap. 1), sob os holofotes dos veículos de mídia do planeta<br />

inteiro, para garantir (também com notável imprecisão) que os genes humanos iam ser<br />

considerados “patrimônio da humanidade”.<br />

Em agosto de 2001, o presidente George W. Bush teve que dedicar a primeira coletiva<br />

de imprensa televisiva ao vivo de sua vida às políticas de seu governo sobre células-tronco.<br />

Se a mídia se constitui um espaço importante na ágora, o foro de debate e tomada de<br />

decisão social, por outro lado, a midiatização da ciência, da tecnologia e o entrelaçamento com<br />

o capitalismo não aparecem apenas no caso do lobbying, da busca de legitimidade política, da<br />

procura por recursos e patrocínios. Os cientistas podem decidir comunicar-se com o “público<br />

leigo” porque, de maneira crescente (e especialmente em algumas áreas do conhecimento) a<br />

visibilidade pública e midiática afeta diretamente sua carreira científica. O reconhecimento<br />

público pode ajudar a “by-passar” os colegas no contexto de uma controvérsia interna à<br />

ciência, a afirmar uma teoria heterodoxa. Mesmo no contexto de um trabalho de ciência<br />

“normal” (em sentido kuhniano: o cientista como solucionador de quebra-cabeças), a<br />

proeminência midiática pode ajudar um pesquisador a encontrar mais alunos, ganhar mais<br />

verbas para projetos, ter reconhecimento e prestígio em diversos contextos sociais: hoje, como<br />

no século XIX (época em que a ciência buscava o máximo de apoio social para sua<br />

profissionalização, legitimação e institucionalização), o número de cientistas comunicadores é<br />

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