10.06.2013 Views

As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

4.2.3 Lobbying científico<br />

Uma faceta interessante, e não suficientemente estudada, dos aspectos manifestamente<br />

políticos do dispositivo tecnocientífico neoliberal, é constituída pela science advocacy: as<br />

práticas de propaganda, marketing e lobbying que instituições científicas ou tecnológicas<br />

exercem em busca de consenso, apoio político, legitimidade pública, recursos (Castelfranchi,<br />

2002). Atividades deste tipo existem desde que existe a ciência: basta pensar nos protetores de<br />

Kepler, Euler, Descartes, ou na decisão de Galileu Galilei de chamar as luas de Júpiter de<br />

“satélites mediceus” 226 . Mas a profissionalização, a institucionalização e a especialização da<br />

<strong>tecnociência</strong> contribuíram para mutações tanto nos processos quanto nos escopos destas<br />

práticas. No século XIX, com a criação de instituições públicas de pesquisa e a incorporação<br />

completa das ciências naturais e experimentais no bojo do sistema universitário, a busca<br />

individual de apoio transformou-se num “lobbying” ante litteram: uma atividade explícita,<br />

consciente, coletiva, de cientistas ou de instituições e associações em prol de espaços na<br />

academia, de financiamentos, de reconhecimento. Michael Faraday e Humphry Davy, junto<br />

com a divulgação da ciência, faziam propaganda. Thomas Huxley falava explicitamente de<br />

recrutar apoio para a “Igreja Ciência”, de fazer “apostolado” (veja cap. 3). Inúmeros cientistas<br />

do século XIX, especialmente na Inglaterra, Alemanha, França e Estados Unidos, fizeram não<br />

somente marketing, mas verdadeiro lobbying para obter recursos para pesquisa e cargos<br />

políticos (no governo e nas universidades) que lhes permitissem alavancar a aceleração<br />

tecnocientífica (Knight, 1986; Bowler e Morus, 2005: cap. 14).<br />

No entanto, é com o <strong>neoliberalismo</strong> e a globalização que o lobbying científico se torna<br />

uma atividade integrada, institucionalizada, antes nos países anglo-saxões, a seguir na Europa<br />

e no resto dos países industrializados. Folhear os arquivos de revistas como Nature e Science<br />

nos últimos dez anos, é uma maneira simples para iluminar o estabelecimento e crescimento<br />

destas práticas: dúzias de eventos, grandes ou menores, dezenas de cartas ao editor, de<br />

reportagens, de editoriais investigam e debatem práticas que predominam numericamente nos<br />

EUA, Canadá, Europa, mas que também são importantes na Austrália, na Nova Zelândia, no<br />

Japão e na Coréia 227 .<br />

226 Em homenagem a seu mecenas e protetor, Cosimo II de’Medici, Grão-Duque de Toscana.<br />

227 Veja, por exemplo: A. Lawler, “Selling Science: At What Price?”, Science, 275, 1997: p. 296; Nature, vol. 391, 19<br />

fevereiro 1998: p. 730; Nature, vol. 406, 17 agosto 2000: p. 663; Science, vol. 294, 16 novembro 2001: p. 1437.<br />

235

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!