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As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

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econômicos, sociais e políticos poderosos emergem a partir de uma complexa rede de<br />

acontecimentos e desencadeamentos não coerentes com os esforços dos indivíduos ou com os<br />

objetivos manifestos de grupos, instituições ou classes sociais.<br />

Junto com essa, outra grande questão atravessa o pensamento de autores e escolas<br />

variados: a aparente capacidade que coisas criadas pelo trabalho de homens e mulheres<br />

parecem adquirir de influenciar ou até mesmo comandar a vida de seus criadores. Como e<br />

quando acontece que instituições, conjuntos de práticas sociais e objetos por estas produzidos<br />

começam a funcionar de uma forma que parece automática, se tornando capazes de pautar ou<br />

moldar os comportamentos dos sujeitos?<br />

A reflexão marxista sobre feitichização e sobre o capital como sujeito automático se<br />

coloca nesta linhagem. Para Marx, “o movimento social como um todo desenvolvido e levado<br />

à prática pela atividade consciente e pela realização dos fins particulares dos indivíduos se<br />

transforma em algo independente daqueles mesmos indivíduos” de modo que “a recíproca<br />

relação social dos indivíduos se transforma em um poder autônomo superior aos indivíduos”<br />

(Marx, Grundrisse, 111; apud Kosik, 1976: p. 82). O movimento social, em suma, se torna<br />

automatizado 306 . Quando Marx fala do fetiche da mercadoria e do funcionamento automático<br />

do capital (O Capital, Parte II, Cap. IV), está descrevendo algo que a ação humana e as<br />

relações entre homens criaram, mas que acaba sendo percebido pelos homens como<br />

funcionando de acordo com uma lógica própria, com notável impermeabilidade com respeito à<br />

vontade dos indivíduos. A valorização do valor avança de maneira aparentemente inexorável,<br />

como um “sujeito” que transcende a vontade dos indivíduos (mesmo a dos próprios<br />

capitalistas).<br />

No âmbito da sociologia da tecnologia, só para apontar mais um exemplo, Thomas<br />

Hughes (1994) propõe o conceito de “momento tecnológico” (no sentido do “momento linear”<br />

da física: a “quantidade de movimento”) como solução para o dilema do determinismo<br />

tecnológico. Para o autor, não é verdade que a sociedade é conformada e moldada pelas<br />

306 Pensador marxista, Kosik chamava “pseudo-concreticidade” a propriedade que fenômenos que povoam o ambiente<br />

cotidiano têm, com sua regularidade, seu imediatismo, sua evidência, de penetrar na nossa consciência e assumir “um<br />

aspecto independente e natural”. Entre tais fenômenos, afirmava o filósofo, há o mundo “da praxis feitichizada dos<br />

homens” e dos “objetos fixados, que dão a impressão de ser condições naturais e não são imediatamente reconhecíveis<br />

como resultados da atividade social dos homens” (Kosik, 1976: p. 11). Ainda segundo Kosik, o defeito da<br />

“investigação analítico-metafísica” estaria justamente no fato de que momentos da atividade social do homem<br />

“transformam-se, na mente humana, em forças independentes que determinam a atividade do homem”. (Ibidem: p. 99-<br />

100).<br />

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