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As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

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A elevada visibilidade midiática da “revolta dos Nobelistas”, no entanto, não<br />

convencia o governo italiano a voltar atrás. O ministro retrucava alegando que ele não era<br />

“contra a ciência”, que a medida de lei estava em acordo com o Princípio de Precaução<br />

(internacionalmente aceito desde a Conferência do Rio 1992 e o Protocolo de Cartagena) e que<br />

a própria comunidade científica estaria dividida quanto à oportunidade de estudar os OGMs<br />

em campo aberto: “Tem mil cientistas se lamentando? Pois tem outros tantos que dizem o<br />

contrário” 221 .<br />

No começo de 2004, um terremoto político se abatia também na comunidade científica<br />

francesa, que reagia com uma guerrilha midiática bem organizada. O governo tentava impor<br />

cortes e restruturações à pesquisa pública, e recusava-se a contratar quinhentos jovens<br />

pesquisadores que haviam passado por concursos. Em resposta, milhares de cientistas<br />

invadiam as praças e as ruas de Paris. Sessenta e cinco mil deles assinavam um pedido,<br />

enquanto dois mil diretores de institutos e chefes de equipes de pesquisa (praticamente a<br />

metade do total do país) anunciavam sua demissão e o bloqueio das atividades por eles<br />

lideradas. 82% dos franceses apoiou os cientistas. O protesto inflamou-se e logo se espalhou a<br />

outras categorias, causando revoltas e tumultos em diversas cidades da França. Poucas<br />

semanas depois o novo governo se rendia e prometia financiamentos para pesquisa 222 .<br />

No ano seguinte, na Itália, foi a vez de um referendum para propor a anulação da lei<br />

sobre fecundação assistida que, aprovada pelo governo conservador de Silvio Berlusconi sob<br />

pressão da Igreja Católica, continha, de acordo com muitos cientistas e com as organizações<br />

feministas, violações gritantes dos direitos da mulher. Na inflamada campanha que seguiu –<br />

em que os católicos conservadores e os partidos de direita incentivaram a população a não<br />

votar (invalidando o referendum por falta de quorum) – alguns pesquisadores desceram na<br />

arena ao lado dos partidários do “sim”. O oncologista Umberto Veronesi (mundialmente<br />

famoso), os geneticistas Alberto Piazza e Edoardo Boncinelli (indicado ao Prêmio Nobel), o<br />

biólogo Carlo Alberto Redi (autor de importantes pesquisas sobre clonagem), entre outros,<br />

tecnologia e desenvolvimento. O aspecto mais atual da afirmação de Garattini, no entanto, é a declaração explícita, por<br />

parte de um cientista, da necessidade imprescindível de “apelar” para “sociedade civil”.<br />

221 O Ministro parece ter percebido a potência de associar sua ação política a um ataque “à ciência” (outra tática<br />

discursiva que analisei no capítulo 3) e se defende contra-atacando: regular a <strong>tecnociência</strong> não é o mesmo que ser<br />

contra.<br />

Disponível no “Site web italiano para a filosofia”: http://lgxserver.uniba.it/lei/rassegna/010213e.htm (em italiano).<br />

Acesso em março de 2008.<br />

222 Veja, por exemplo, http://news.bbc.co.uk/1/hi/world/europe/3610765.stm. Acesso em março de 2008.<br />

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