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As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

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não conseguimos pegar a não ser correndo. Um bonde que não se pode dirigir ou desmontar. É<br />

uma mega-máquina que não deve precisar de motorista. Só precisa de um tipo de regime cujo<br />

objetivo seja garantir sua aceleração, cuja “verdade” consista em saber como aumentar sua<br />

eficiência, cuja prática consista em adaptar e moldar o governo das coisas e das pessoas em<br />

função desta aceleração e eficiência.<br />

Por outro lado, a <strong>tecnociência</strong> também precisa regular interagindo, modular escutando.<br />

<strong>As</strong> instituições científicas e tecnológicas, em sua ligação com o mercado, precisam comunicar.<br />

Porque através dos discursos públicos é que conseguem produzir conhecimentos, mobilizar<br />

corpos e idéias, recrutar talentos e constituir-se como uma profecia auto-realizada. Um<br />

complexo conjunto de enunciados consegue ajudar a ciência e a tecnologia a estar no centro da<br />

atenção política, mas também a despolitizar-se, deslocar-se da submissão à negociação<br />

política.<br />

No capítulo 3, quero mapear este discurso a partir de alguns elementos situados em<br />

encruzilhadas históricas nas quais se configuram novas técnicas de governo e novas<br />

racionalidades econômicas. Tais encruzilhadas se situam entre os séculos XVI-XVII, XVIII-<br />

XIX e na segunda metade do século XX. A <strong>tecnociência</strong> é “inevitável” – e inevitavelmente<br />

certa – porque fundada, por exemplo, numa ciência que é universal, objetiva, baseada em fatos<br />

e dados imanentes, independentes dos juízos de valor. Verdade e imparcialidade dos fatos<br />

científicos (e das “leis de natureza”) acabam contagiando discursivamente os efeitos de<br />

verdade e inevitabilidade do capitalismo (e das “leis de mercado”). A potência da tecnologia<br />

moderna em prever e dominar os processos da matéria animada e inanimada acaba<br />

fornecendo símbolos e sinais de poder e de progresso ao livre mercado, numa espécie de<br />

feitichização mútua e dinâmica. Examinarei, então, alguns elementos chaves que são comuns<br />

ao discurso da ciência, da tecnologia e do capitalismo. Pureza, imanência, aceleração,<br />

neutralidade, abstração, máquina, regulação, probabilidade, campo, relação, são lugares-<br />

comuns discursivos, substratos conceituais e topoi retóricos que surgem numa esfera, são<br />

recombinados em outras e acabam maquinizando e despolitizando as “leis de mercado”, a<br />

“liberdade de pesquisa” e a técnica que “pode ser usada para o bem ou para o mal”.<br />

Mostrarei que estes elementos discursivos são “reais”: descrevem práticas e relações<br />

concretas. E, contemporaneamente, são efeitos de verdade contingentes, porque não são os<br />

únicos possíveis, mas descendem de uma genealogia funcional a uma economia de poder<br />

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