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de Investigadores em leitura - Universidade do Minho

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1. Introdução<br />

Ao referir-se às Aventuras <strong>de</strong> Pinóquio: História <strong>de</strong> um Boneco, escrito por Carlo<br />

Collodi, cuja primeira edição completa data <strong>de</strong> 1883, Italo Calvino (2004: 210-211) afirma<br />

que “cada aparição apresenta-se com uma força visual, simbólica, tal que não conseguimos<br />

esquecê-la”. Calvino não só alu<strong>de</strong> ao impacto das <strong>de</strong>scrições dinâmicas <strong>de</strong> situações e<br />

personagens que suscitam imagens, ora familiares, ora inesperadas, no alocutário, mas<br />

também alarga o espectro <strong>de</strong> leitores possíveis <strong>de</strong> Pinóquio a uma audiência diversificada e<br />

não apenas aos “piccoli lettori” (pequenos leitores), tal como são <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong>s no espaço<br />

enunciativo (Collodi 1883). Se não, atent<strong>em</strong>os na página inicial da narrativa, na sua versão<br />

<strong>em</strong> português, traduzida por Margarida Periquito, com ilustrações <strong>de</strong> Paula Rego, publicada<br />

<strong>em</strong> 2004, que tenta seguir os padrões <strong>do</strong>s contos <strong>de</strong> fadas ou lendas, com a referência a: “-<br />

Um rei! – dirão imediatamente os meus pequenos leitores.” (Collodi 2004: 5).<br />

O diálogo entabula<strong>do</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, <strong>de</strong>frauda as expectativas <strong>do</strong> leitor (estranhamento),<br />

pois a personag<strong>em</strong> referida não é um rei, mas um boneco <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira, o que intriga o leitor.<br />

É o próprio narra<strong>do</strong>r que convida os “pequenos leitores” a participar no universo diegético, e<br />

a tentar <strong>de</strong>svendar a história <strong>de</strong> um boneco <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira, ao animar um “simples pedaço <strong>de</strong><br />

lenha, daqueles que no Inverno se põ<strong>em</strong> nos fogões e nas lareiras (…). Não sei como é que<br />

ele conseguia andar (…)”. Aliás, a metáfora lexical, relacionada com o “pedaço <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira”,<br />

é um <strong>do</strong>s el<strong>em</strong>entos <strong>de</strong> coesão na narrativa, entre outros elos coesivos explícitos no texto,<br />

tais como os <strong>de</strong>monstrativos e os locativos (coesão gramatical). A coesão ocorre, segun<strong>do</strong><br />

Halliday & Hasan (1976: 4), “where the interpretation of some el<strong>em</strong>ent in the text is<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nt on that of another. The one presupposes the other, in the sense that it cannot be<br />

effectively <strong>de</strong>co<strong>de</strong>d except by recourse to it.” Saben<strong>do</strong> que os el<strong>em</strong>entos <strong>de</strong> coesão são<br />

mais perceptíveis a leitores com <strong>de</strong>senvolvimento linguístico e sócio-cognitivo relativo ao<br />

perío<strong>do</strong> operatório-formal, i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong> a partir da ida<strong>de</strong> <strong>de</strong> 12 anos, como consegu<strong>em</strong>,<br />

então, os “pequenos leitores” <strong>de</strong>sambiguar referências en<strong>do</strong>fóricas e exofóricas no texto <strong>de</strong><br />

Collodi? Para além disso, se no mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> enunciação discursivo, <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> pelo acto <strong>de</strong><br />

enunciação, as coor<strong>de</strong>nadas <strong>de</strong> referência coinci<strong>de</strong>m com o “eu-aqui-agora”, tal como<br />

adianta Irene Fonseca (1990: 99), no mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> enunciação narrativo, nomeadamente na<br />

ficção literária, os marcos <strong>de</strong> referência não coinci<strong>de</strong>m com “a instância enunciativa<br />

presente porque [são] transpostos para uma situação ausente que po<strong>de</strong> ser um futuro<br />

possível, um passa<strong>do</strong> real ou um irreal imaginário indiferente ao t<strong>em</strong>po.”Na verda<strong>de</strong>, <strong>em</strong>bora<br />

o código seja reconheci<strong>do</strong> e <strong>de</strong>scodifica<strong>do</strong>, aqueles tornam-se <strong>de</strong> difícil compreensão pois<br />

os jovens leitores n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre consegu<strong>em</strong> interpretá-las no contexto narrativo. Saben<strong>do</strong>-se<br />

que o “eu” toma como ponto <strong>de</strong> referência a sua existência no momento da enunciação, é<br />

<strong>de</strong> esperar que coor<strong>de</strong>nadas espácio-t<strong>em</strong>porais sejam factores perturba<strong>do</strong>res na percepção<br />

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