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de Investigadores em leitura - Universidade do Minho

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que se po<strong>de</strong> verificar “como os contos, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> 1849, tomaram uma forma mais firme,<br />

tornan<strong>do</strong>-se mais frequente a <strong>de</strong>scrição na primeira pessoa” 25<br />

.<br />

Esta aproximação <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r ao leitor t<strong>em</strong> naturalmente consequências no plano<br />

técnico-compositivo. Veja-se, por ex<strong>em</strong>plo, como o parágrafo final <strong>do</strong> pequeno conto “O<br />

Menino Mau” (o qual, diga-se <strong>de</strong> passag<strong>em</strong>, se ass<strong>em</strong>elha a uma alegoria) é pródigo <strong>em</strong><br />

exclamações, enfatizan<strong>do</strong> a participação <strong>em</strong>otiva <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r no seu próprio discurso, e<br />

como, nesse mesmo parágrafo, há uma intencional redundância pela repetição das formas<br />

verbais na segunda pessoa <strong>do</strong> singular, interpelan<strong>do</strong> directamente o leitor / ouvinte.<br />

Eis apenas a parte final <strong>de</strong>sse parágrafo <strong>em</strong> que se relatam as travessuras <strong>do</strong><br />

menino Amor:<br />

“Sim, ele uma vez disparou sobre teu pai e tua mãe no coração! Pergunta-lhes,<br />

ouvirás o que diz<strong>em</strong>. Sim, é um menino mau, o Amor, com ele nunca <strong>de</strong>ves tratar! Corre<br />

atrás das pessoas. Pensa que uma vez ele disparou mesmo uma flecha na velha avó, mas<br />

foi há muito, já é coisa passada. Mas não o esquece ela nunca! Irra! O mau Amor! Mas<br />

agora já o conheces! Sabes que menino mau é!” 26<br />

Po<strong>de</strong>mos também ver o início <strong>do</strong> conto “As galochas da felicida<strong>de</strong>”. Aqui, a voz<br />

narrativa convoca o leitor / ouvinte para a construção da diegese que é (ou parece ser)<br />

arquitectada no próprio momento <strong>em</strong> que ocorre o acto comunicativo, o qual se instaura<br />

<strong>em</strong> presença – estilisticamente b<strong>em</strong> marcada pelo presente <strong>do</strong> indicativo e pelo advérbio<br />

<strong>de</strong> t<strong>em</strong>po “agora”. Cito duas frases ex<strong>em</strong>plificativas: a primeira ocorre <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> o narra<strong>do</strong>r<br />

apresentar o ambiente geral <strong>de</strong>ntro da casa, e expressa o convite ao leitor para partir com<br />

ele <strong>em</strong> busca <strong>de</strong> algo interessante para a história, dizen<strong>do</strong>-lhe:<br />

“Sim, vamos agora ver se se encontra alguma coisa!”<br />

E mais à frente continua:<br />

“Vamos sair para entrar na sala <strong>em</strong> frente” 27<br />

Este procedimento narrativo aproxima o texto <strong>do</strong> escritor <strong>de</strong> O<strong>de</strong>nse <strong>do</strong>s mo<strong>de</strong>rnos<br />

romancistas, <strong>em</strong> que o narra<strong>do</strong>r assume um estatuto <strong>de</strong> ser <strong>de</strong>miurgo <strong>em</strong> relação ao<br />

mun<strong>do</strong> ficcional que vai construin<strong>do</strong>.<br />

Embora crian<strong>do</strong> histórias originais, a sintaxe narrativa <strong>de</strong> An<strong>de</strong>rsen revela uma<br />

intencional manutenção da oratura, pela interpelação <strong>do</strong> leitor, chaman<strong>do</strong>-o a ouvir a voz<br />

da enunciação discursiva que, argutamente, surpreen<strong>de</strong> as questões que a entida<strong>de</strong><br />

25<br />

DUARTE, João da Silva, “Prefácio”, in: ANDERSEN, Hans Christian, Histórias e contos completos, [Trad.<br />

João da Silva Duarte], V. N. Gaia, Edições Gailivro, 2005, p.15.<br />

26<br />

ANDERSEN, Hans Christian, Histórias e contos completos, [Trad. João da Silva Duarte], V. N. Gaia, Edições<br />

Gailivro, 2005, p.46.<br />

27<br />

Id., Ibi<strong>de</strong>m, p.75.<br />

233

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