20.04.2013 Views

de Investigadores em leitura - Universidade do Minho

de Investigadores em leitura - Universidade do Minho

de Investigadores em leitura - Universidade do Minho

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

O hom<strong>em</strong> <strong>de</strong>scobre, graças ao cristianismo, a sua dupla natureza, corporal e<br />

espiritual. Descobre simultaneamente o espírito <strong>de</strong> exame e o sentimento <strong>de</strong> melancolia.<br />

Na poesia mistura-se "a sombra e a luz, o grotesco e o sublime". Nasce um novo princípio,<br />

o grotesco, mais varia<strong>do</strong> que o sublime.<br />

Cito mais uma vez o gran<strong>de</strong> romântico francês:<br />

“La poésie née du christianisme, la poésie <strong>de</strong> notre t<strong>em</strong>ps est <strong>do</strong>nc le drame; le<br />

caractère du drame est le réel; le réel résulte <strong>de</strong> la combinaison tout naturelle <strong>de</strong> <strong>de</strong>ux<br />

types, le sublime et le grotesque, qui se croisent dans le drame, comme ils se croisent<br />

dans la vie et dans la création. Car la poésie vraie, la poésie complète, est dans l’harmonie<br />

<strong>de</strong>s contraires.” 41<br />

Sen<strong>do</strong> essencialmente romântica, a obra <strong>de</strong> An<strong>de</strong>rsen é profundamente humana.<br />

Como tal, nela se mistura a <strong>em</strong>oção e a ternura com o sofrimento e a <strong>do</strong>r, a alegria com a<br />

tristeza, a fantasia e o humor com o real e a sátira. Em suma, a complexida<strong>de</strong> humana t<strong>em</strong><br />

aí lugar, ou melhor, aí há lugares para toda a complexida<strong>de</strong> humana.<br />

É, pois, importante referir que a infância não é para H. C. An<strong>de</strong>rsen uma utopia. Não<br />

o é n<strong>em</strong> na primeira acepção <strong>do</strong> termo, n<strong>em</strong> no senti<strong>do</strong> mais vulgar que ele hoje adquiriu.<br />

Isto é, a infância é um “lugar” b<strong>em</strong> real, profundamente complexo, <strong>em</strong> que o ser (refiro-me<br />

ao ser que é a criança) se exalta perante a <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong> si e <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> e<br />

simultaneamente se angustia diante da imensidão <strong>de</strong>sse mun<strong>do</strong>; a infância é um t<strong>em</strong>po<br />

b<strong>em</strong> real <strong>em</strong> que o ser se entrega puro à força <strong>do</strong> amor e <strong>em</strong> que, por outro la<strong>do</strong>, sofre<br />

(quantas vezes até à morte) as injustiças e as cruelda<strong>de</strong>s <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.<br />

Concluin<strong>do</strong>, <strong>de</strong>staco algumas linhas t<strong>em</strong>áticas 42<br />

que me parec<strong>em</strong> fundamentais no<br />

gran<strong>de</strong>, e também ele complexo, conjunto <strong>de</strong> contos infantis <strong>de</strong> An<strong>de</strong>rsen.<br />

Em primeiro lugar, a valorização <strong>do</strong> sujeito, ten<strong>do</strong> <strong>em</strong> conta as suas qualida<strong>de</strong>s<br />

intrínsecas, e não os seus atributos exteriores, ou privilégios sociais. A valorização <strong>do</strong><br />

sujeito capaz <strong>de</strong> se aventurar, <strong>do</strong> sujeito que é persistente na busca da sua felicida<strong>de</strong>,<br />

daquele que, sentin<strong>do</strong> a atracção pelo diferente, pelo incomum, pela aventura, busca o<br />

misturada com a luz. Na época romântica o grotesco fez uma “alliance intime et créatrice avec le beau”<br />

(HUGO, Préface <strong>de</strong> Cromwell, p.53). Eis aqui um <strong>do</strong>s pilares da teoria romântica – a harmonia <strong>do</strong>s<br />

contrários.<br />

40 O sublime é mais difícil <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir. Estamos, <strong>de</strong> qualquer mo<strong>do</strong>, perante o questionamento da individualida<strong>de</strong><br />

unitária. É a recusa <strong>do</strong> uno que confere ao drama romântico a sua complexida<strong>de</strong>. Até porque o grotesco é<br />

mais produtivo que o sublime. “Dans la pensée <strong>de</strong>s mo<strong>de</strong>rnes, au contraire, le grotesque a un rôle immense. Il<br />

est partout.” (HUGO, Préface <strong>de</strong> Cromwell, p.45). A supr<strong>em</strong>a importância <strong>do</strong> grotesco na arte mo<strong>de</strong>rna é<br />

taxativamente apontada na seguinte expressão: “Le grotesque est, selon nous, la plus riche source que la<br />

nature puisse ouvrir à l’art.” (Id., Ibi<strong>de</strong>m, p.47).<br />

Por último, o grotesco não é apenas circunstancial <strong>em</strong> relação ao drama, ele não está exclusivamente na<br />

esfera <strong>do</strong> existencial (dramático), mas na <strong>do</strong> essencial. Quer isto dizer que o grotesco é um el<strong>em</strong>ento<br />

constituinte da essência <strong>de</strong>ste novo género – o drama. “C’est <strong>do</strong>nc une <strong>de</strong>s suprêmes beautés du drame que<br />

le grotesque. Il n’en est pas seul<strong>em</strong>ent une convenance, il est souvent une nécessité.” (Id., Ibi<strong>de</strong>m, p.64).<br />

41 HUGO, Préface <strong>de</strong> Cromwell, p.60.<br />

42 Cf. COELHO, Panorama histórico da literatura infantil / juvenil, p.119-120.<br />

237

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!