Estudos de philologia mirandesa - Esycom

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de população não devia ser tal, que fizesse que o idioma
local e indigena soífresse muito, porque não se trata
de população culta, mas de população pela maior parte,
senão completamente, composta de analphabetos, a qual
era logo mais ou menos absorvida pela preexistente;
ainda que os que chegavam de novo não aprendessem
o mirandês, as crianças nascidas em Miranda apren-
diam-no, como sempre succede em circumstancias aná-
logas.
Combinando entre si as notícias ministradas por Jeronymo
Cardoso, loc. laud., e por um manuscrito da
Bibliotheca Nacional de Lisboa, a que em breve me
referirei, podemos esboçar o seguinte quadro da cidade
de Miranda no sec. xvii, isto é, no auge do seu ephemero
brilho: a gente não tem industrias notáveis', limi-
tando-se a trabalhos agricolas, a cultivar o seu centeio,
o seu vinho, a criar as suas vitellas, os seus carneiros,
os seus porcos, e, quando muito, a negociar com a de
fora em sabão, couramas, peças de lã e almafega, cele-
brando para isso uma feira mensal; a mais d'ella «é
plebea, e, fora o clero, ha poucos nobres»; os do povo
«vestem-se mui grosseiramente, usando de pannos com
as mesmas ourelas, que lhe ficão em modo de guar-
niçoens-, as molheres trazem no meio da cabeça uns
toucados altos, como meia-lua»; esta cidade é, «como
todos os mais lugares de Tras-os-Montes, de grandes
lodos, porque não costumão mandar alimpar as ruas,
antes mandão lançar muita quantidade de tojos, fetos
e outras hervas, porque molhando-se com a chuva, e
pisando-se com a gente, se corrompão»; os habitantes,
1 Uma carta de D. João III, dada em i524, allude aos tecelões
e tecedeiras de lã e linho, de Miranda (vid. o livro da respectiva
Chancellaria, iv, fls. gS-v, na Torre do Tombo) ; mas isto devem
ser industrias caseiras, sem importância.
2 Hoje são célebres as capas de honras de Miranda (cf. p. 48),
que provavelmente datam já muito de trás.