Estudos de philologia mirandesa - Esycom

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Por este e outros motivos que vou indicar, a litteratura
popular mirandesa é muito pobre. Já vimos que lhe
faltam as orações, que, por muitas vezes serem em
verso, ou terem forma prosaica bem definida, constituem
a cada passo elementos de riqueza litteraria. As
cantigas são quasi sempre, senão sempre, em português;
eu colhi algumas em mirandês, mas foram traduzidas
por quem m'as recitou. Comprehende-se que as can-
tigas sejam em português, porque não tem lá o seu
berço, são transmittidas de outras localidades, voam
de boca em boca pelo pais todo, desde o Guadiana
até o Sàbôr. Contos e adágios ouvi e copiei alguns
em mirandês, e de um, recolhido pelo Sr. Gonçalves
Vianna, fallei a p. 3o; mas é provável que todos ou a
maior parte também tenham forma portuguesa.
Se da litteratura tradicional passarmos á individual e
moderna, não achamos quasi nada. Algumas pessoas
entretem-se, por curiosidade, a fazer diálogos mirandeses;
alguns obtive manuscritos, quando estive em
Miranda. Neste sentido o facto mais curioso que co-
nheço é o da existência do entremês que citei a p. 3o do
Gap. II. Intitula-se, como disse, Stiiriano i Marcolfa;
os personagens faliam mirandês, gallego e português.
Gomo a palavra Sturtano está por Asturiano, vê-se
que o entremês synthetiza os factos glottologicos da
região, pois pelo titulo relaciona-se com a Hespanha,
com um dialecto, — o asturiano ou bable— ,
que tantas
affinidades tem em certos casos com o mirandês, e pela
lingoagem dos interlocutores representa as três outras
lingoas conhecidas alli.
Estes factos dizem respeito á litteratura individual e,
por assim dizer, espontânea. Pelo que toca á litteratura
reflectida, que foi motivada pelo estudo scientifico do
mirandês, nada tenho que accrescentar ao que desen-
volvidamente mencionei no Gap. II, p. 21 sqq.
De tudo isto se vê que o grau de vitalidade do miran-
dês é pequeno: de um lado, quasi lhe falta absoluta-