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emigração e retorno no porto oitocentista - Repositório Aberto da ...

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Jorge Fernandes Alves – Os Brasileiros, Emigração e Retor<strong>no</strong> <strong>no</strong> Porto Oitocentista 396<br />

inesperado encontro com um ig<strong>no</strong>to primo brasileiro. José Régio deu forma literária à<br />

convivência fantasmática com o seu tio-avô "brasileiro", que não conheceu, mas cuja<br />

sombra tutelar paira ain<strong>da</strong> sobre A Velha Casa, que fora também do velho tio. Para a<br />

juventude curiosa que a habitava, este é um enigma: como conseguiu a riqueza? ver<strong>da</strong>de<br />

que era <strong>da</strong> maçonaria e através dela se fez rico? era religioso e rigorista sob o ponto de<br />

vista moral? confirmava-se o sussurrado filho ilegítimo? Mistérios de romance que<br />

convém não desven<strong>da</strong>r200 .<br />

Para os <strong>no</strong>ssos objectivos mais prosaicos201 , José Maria Pereira é um emigrante<br />

de Vila do Conde que retorna <strong>no</strong> final de uma vi<strong>da</strong> comercial, para descansar e morrer<br />

junto dos familiares, sem objectivos de participação política visíveis, nem grande vontade<br />

para benemerências. Seria o outro tipo de brasileiro, já antes anunciado por Ramalho<br />

Ortigão, quando caricaturava o "brasileiro" tradicional, a quem a pátria explorava e de<br />

quem se ria, perante o <strong>no</strong>vo exemplo do que, "sem pedras e sem papagaios, posto que<br />

com fortuna", não pagando e resignando a comen<strong>da</strong>, "vai chegar - para se rir" 202 ?<br />

O caso do José, o seu ascendente sobre os familiares, os seus comportamentos<br />

para com os pais, o facto de os seus bens reverterem para a família, explica-se, em grande<br />

medi<strong>da</strong>, pelo quadro familiar de origem. José era o filho varão, a quem por tradição cabia<br />

a protecção <strong>da</strong> casa na ausência dos pais. Derivava de uma família que era um caso raro<br />

de fecundi<strong>da</strong>de: 14 filhos, dos quais 11 chegaram à i<strong>da</strong>de adulta e morreram de i<strong>da</strong>de<br />

avança<strong>da</strong> (ver Diagrama) 203 . Os dois filhos rapazes anteriores a José tinham morrido<br />

muito cedo: o João com o garrotilho aos 26 meses e um primeiro José, aos 21 meses,<br />

com "moléstia" desconheci<strong>da</strong>. À volta do <strong>no</strong>vo José ciran<strong>da</strong>vam 7 irmãs, umas mais<br />

velhas, outras mais <strong>no</strong>vas do que ele. Os restantes 4 rapazes sobreviventes só apareceram<br />

a partir do 11º nascimento. Quando José embarca para o Brasil, em 1844, já as irmãs<br />

mais velhas estavam casadoiras, e o outro rapaz mais idoso tinha apenas 7 a<strong>no</strong>s.<br />

200 Cf. de RÉGIO, José, A Velha Casa - II - As raízes do Futuro, Porto, Editora Educação Nacional, 1947,<br />

pp. Idem, Confissão de um Homem Religioso, Porto, Brasília Editora, 1971, pp. 23-60. Sobre este aspecto,<br />

ver também PEREIRA, João Reis, "José Régio - Amar as flores e ser jardineiro foi também fado", Vila do<br />

Conde - Boletim Cultural, Nova série, nº 9, Vila do Conde, C. Municipal, 1990, pp. 7-14.<br />

201 Esta biografia tem por base documentação particular, constituí<strong>da</strong> por uma agen<strong>da</strong> de lembranças para o<br />

a<strong>no</strong> de 1890, um livro de registo de operações financeiras entre 1883-1904 e alguns papéis avulsos, além<br />

<strong>da</strong> cita<strong>da</strong> em ro<strong>da</strong>pé. Ao dr. João Maria dos Reis Pereira, sobrinho-neto do biografado, que <strong>no</strong>s<br />

disponibilizou a documentação e ao sr. Monteiro dos Santos, pelas informações e mediação o <strong>no</strong>sso<br />

reconhecimento.<br />

202 Cf. ORTIGÃO, Ramalho, "Os comen<strong>da</strong>dores e os cães de faiança", As Farpas - XV, 1876-1882,<br />

Lisboa, Clássica Editora, 1993, p. 203.<br />

203 Confrontando este caso com o que se passava <strong>no</strong> domínio <strong>da</strong> fecundi<strong>da</strong>de em Bougado, observamos<br />

que a proporção de famílias com 14 filhos era apenas de 3‰. Aí, em 599 famílias apenas duas se<br />

encontravam nesta situação, entre os a<strong>no</strong>s 1680-1829. Cf. ALVES, Jorge Fernandes, "Fecundi<strong>da</strong>de Natural<br />

<strong>no</strong> Vale do Ave - O exemplo de Bougado (1680-1849), Revista <strong>da</strong> Facul<strong>da</strong>de de Letras - História, II série,<br />

vol. VI, Porto, 1989, pp. 287-309.

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