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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO<br />
consistente na violação do dever de “arrecadar”, e da qual aquela depende<br />
necessariamente, como trânsito necessário para atingir o preceito incriminador.<br />
Portanto, penaliza-se o descumprimento de um dever fiscal, pois, para a<br />
Previdência Social, pouco importa que os empregados venham ou não recebendo em<br />
dia os seus salários, ou que estes estejam atrasados por dois, quatro, seis meses,<br />
importando-lhe, isso sim, o recebimento da contribuição que não foi arrecadada<br />
simplesmente porque não houve pagamento de salários.<br />
Estas considerações servem para chamar à reflexão os que supõem que o<br />
crime omissivo puro ou omissivo próprio, também chamado de mera conduta,<br />
contenta-se com a tipicidade, tendo na sua base uma culpabilidade presumida, porque,<br />
fosse assim, estar-se-ia consagrando uma responsabilidade objetiva, incompatível com<br />
o Direito Penal. Pelo simples fato de não ter tido a empresa condições financeiras para<br />
pagar os salários dos seus empregados, teria descumprido o dever legal de recolher a<br />
contribuição previdenciária que incide sobre eles, e, como tal, estariam os seus<br />
dirigentes sujeitos à sanção penal.<br />
Vê-se que o preceito incriminador soa como “deixar de recolher” a<br />
contribuição “arrecadada” do empregado, pelo que, se a empresa, por dificuldades<br />
financeiras ou qualquer motivo que seja, faz inserir nos contracheques de seus<br />
empregados uma parcela de abatimento referente ao valor da contribuição<br />
previdenciária, que não recolheu por não ter condições de recolher, na verdade o que<br />
fez foi descumprir o dever de arrecadar (art. 30, I, “a”, Lei nº 8.212/91), fato impunível<br />
pela ausência de tipicidade, praticando em seu lugar uma falsifidade ideológica, como<br />
tal descrita no art. 299 do Código Penal.<br />
A perícia penal é importante para determinar se havia recursos financeiros<br />
para pagar salários, neles embutida a contribuição previdenciária a cargo dos<br />
empregados, caso em que ainda se pode falar num delito do tipo descrito no art. 95,<br />
“d”, da Lei nº 8.212/91, ou se não havia recursos suficientes para tanto, embora tenha<br />
a empresa inserido nos contracheques esse valor que não foi pago, e, portanto, não<br />
arrecadado, caso em que, quando muito, poder-se-á falar do crime previsto no art. 299<br />
do Código Penal.<br />
Em tais casos, a materialidade do delito não se prova pela exibição de um<br />
simples auto de infração, sujeito à contestação em sede administrativa, não tendo<br />
os fiscais do INSS fé pública, sendo seus atos quando muito dotados de mera<br />
presunção de legitimidade, que, de resto, possui todo ato emanado do Poder Público;<br />
e a autoria não decorre de uma simples qualificação funcional (diretor, gerente,<br />
Rev. jurisprud. Trib. Reg. Fed. 2. reg. v. 10, n. <strong>33</strong>, p. 1-<strong>33</strong>9, jan./mar. 2002