19.04.2013 Views

O PCP e a guerra fria.pdf - RUN UNL - Universidade Nova de Lisboa

O PCP e a guerra fria.pdf - RUN UNL - Universidade Nova de Lisboa

O PCP e a guerra fria.pdf - RUN UNL - Universidade Nova de Lisboa

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

A confiança política nos quadros significava objectivamente aplicar a orientação<br />

partidária numa lógica <strong>de</strong> correia <strong>de</strong> transmissão junto dos organismos inferiores.<br />

Assim, os critérios <strong>de</strong> <strong>de</strong>dicação enleavam-se com seguidismo, o que fazia com<br />

que no processo <strong>de</strong> recrutamento <strong>de</strong> novos funcionários se procurassem quadros que<br />

não levantassem problemas, não discordassem em matéria <strong>de</strong> linha política. Diz<br />

Francisco Martins Rodrigues “lembro-me <strong>de</strong> ouvir um dirigente do Partido, o Pires<br />

Jorge referir-se a um militante que era proposto para funcionário. Ele comentava: «Ele<br />

é bom; encosta bem.» Queria ele dizer, utilizando um dito camponês, que o tal tipo<br />

tinha a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um cavalo que puxa um carro no bom sentido e que não o faz sair<br />

da estrada” 1477 .<br />

Este perfil <strong>de</strong> correia <strong>de</strong> transmissão associado às rigorosas condicionava<br />

fortemente quer a autonomia quer à iniciativa no que se refere por exemplo à atitu<strong>de</strong> a<br />

tomar face a movimentações sociais.<br />

Ainda Martins Rodrigues, refere como em meados dos anos 50 num encontro<br />

com o seu controleiro, na altura Américo Gonçalves <strong>de</strong> Sousa, ao falar-lhe<br />

entusiasmado numa greve em curso num dos sectores que controlava, recebeu, chocado,<br />

da parte <strong>de</strong>ste um comentário seco e distante: “calma aí, <strong>de</strong>ixa-os lá fazer greve [que]<br />

nós, o aparelho, temos <strong>de</strong> estar recuados, quer dizer, há lá camaradas, logo se vê,<br />

pronto” 1478<br />

Na cultura da clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong> valorizava-se ainda a discrição, <strong>de</strong> modo a<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a organização.<br />

João Honrado, funcionalizado em 1955, seria quase <strong>de</strong> imediato enviado para o<br />

norte e incumbido <strong>de</strong> controlar o sector intelectual do Porto. Apreensivo com o facto<br />

pela sua inexperiência e pela própria formação escolar, acabaria por ser “esclarecido<br />

que o Partido exigia <strong>de</strong> mim, agora, capacida<strong>de</strong> conspirativa e firmeza perante o<br />

inimigo se porventura viesse a ser preso. Eram tão somente – o que não era pouco – as<br />

condições exigidas para funcionário do <strong>PCP</strong> na clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>” 1479<br />

Na prática isto significava que no interior do aparelho clan<strong>de</strong>stino,<br />

<strong>de</strong>signadamente para tarefas <strong>de</strong> apoio que não implicassem controlo político,<br />

<strong>de</strong>signadamente ao nível das estruturas <strong>de</strong> apoio à Direcção e ao Secretariado em<br />

particular, podiam ser <strong>de</strong>stacados militantes com fraca capacida<strong>de</strong> política, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />

1477<br />

Francisco Martins Rodrigues, História <strong>de</strong> uma luta, <strong>Lisboa</strong>, Abrense Editora/Dinossauro, 2009, p. 50<br />

1478<br />

Entrevista a Francisco Martins Rodrigues, <strong>Lisboa</strong>, 7 <strong>de</strong> Maio <strong>de</strong> 1997<br />

1479<br />

João Honrado, Encontros clan<strong>de</strong>stinos com Papiniano Carlos, 4.12. 2008, in www.alentejopopular.pt/pagina.asp?id=636<br />

612

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!