19.04.2013 Views

O PCP e a guerra fria.pdf - RUN UNL - Universidade Nova de Lisboa

O PCP e a guerra fria.pdf - RUN UNL - Universidade Nova de Lisboa

O PCP e a guerra fria.pdf - RUN UNL - Universidade Nova de Lisboa

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

primeiro encontro, <strong>de</strong> maneira <strong>de</strong>cisiva, que “um comunista não fala na polícia se for<br />

preso” e nunca dirá a ninguém que é membro do Partido” 1756<br />

O folheto Se fores preso, camarada sistematizava as situações e os<br />

comportamentos correspon<strong>de</strong>ntes, preocupação que estava aliás patente em muitos<br />

outros documentos. Uma das estrofes do chamado Hino <strong>de</strong> Caxias, por exemplo,<br />

divulgado e cantado clan<strong>de</strong>stinamente era naturalmente esclarecedor – “po<strong>de</strong>m cortar<br />

meu corpo à chicotada/ po<strong>de</strong>m calar meu grito enrouquecido/ que a minha boca ficará<br />

fechada/ não trairá os segredos do partido” 1757 .<br />

Soeiro Pereira Gomes, já <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> passar à clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong> <strong>de</strong>dica um dos seus<br />

Contos Vermelhos à situação <strong>de</strong> levar a resistência frente à polícia às últimas<br />

consequências. Em Mais um herói, um conto <strong>de</strong> Janeiro <strong>de</strong> 1949, é o elogio do militante<br />

que corajosa e abnegadamente recusa qualquer tipo <strong>de</strong> cedência ou colaboração com a<br />

polícia que se traduzisse na revelação <strong>de</strong> segredos do partido ou na <strong>de</strong>núncia <strong>de</strong><br />

camaradas seus, com sacrifício da própria vida:<br />

“Deitado no chão por uma chicotada, com a cara cortada <strong>de</strong> lado a lado, ficou<br />

a escabujar sob os golpes ininterruptos dos agentes, e a resguardar a cabeça no<br />

casaco, como se este pu<strong>de</strong>sse couraçá-lo. Já o sangue escorria das roupas para o chão<br />

e os agentes pareciam enojados, ainda o chefe gozava a cena, com sádica expressão.<br />

Por fim, quando Paulo já quase não reagia às chicotadas, aquele levantou-lhe a<br />

cabeça e gritou:<br />

- Fala sacana!<br />

- Não trairei… nem que… - começou Paulo a dizer. Mas o polícia atirou-lhe um<br />

soco à boca, que lhe fez saltar os <strong>de</strong>ntes da frente, <strong>de</strong> mistura com sangue e gemidos <strong>de</strong><br />

dor.<br />

O jovem caiu para trás. Dos seus lábios já não podiam soltar-se mais palavras.<br />

Mas os olhos, muito abertos, e os punhos cerrados, diziam por ele:<br />

- Nem que me matem!” 1758 .<br />

Quando a gravida<strong>de</strong> das <strong>de</strong>clarações prestadas não implicava expulsão, era<br />

admitida a recuperação e consequente reenquadramento do militante, o processo em<br />

regra lento e sujeito a uma acrescida prestação <strong>de</strong> provas <strong>de</strong>stinadas a verificar se tinha<br />

havido evolução da sua consciência, <strong>de</strong> modo a que em caso <strong>de</strong> nova prisão garantisse<br />

enfrentar corajosamente a polícia.<br />

1756 Manuel Pedro, Sonhos <strong>de</strong> poeta, vida <strong>de</strong> revolucionário, <strong>Lisboa</strong>, Edições Avante!, 2004, , p. 49<br />

1757 IANTT, PIDE-DGS, P. 570/GT, Hino <strong>de</strong> Caxias, [112 v.], mns<br />

1758 Soeiro Pereira Gomes, Mais um herói, in Obra Completa, <strong>Lisboa</strong>, Caminho, 1992, p. 396<br />

749

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!