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Anais DCIMA Final-1

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Página 510<br />

veementemente a influência de Sigmund Freud em sua arte, e aproveitou a ocasião para fazer um estudo do<br />

velho psicanalista para um desenho posterior, Sigmund Freud declarou diante da “Metamorfose de Narciso”<br />

(1936): “Nas pinturas clássicas procuro o inconsciente – em uma pintura surrealista, o consciente”. Este<br />

comentário significou, para o referido artista, a sentença de morte do surrealismo.<br />

A meu ver, mais do que simples mal-entendidos, os desencontros entre Sigmund Freud e os surrealistas<br />

refletem o fato da psicanálise sofrer no surrealismo uma distorção capaz de criar uma espécie de ficção de<br />

psicanálise. A intenção “sintética” e “totalizante” de André Breton, nas palavras do notável psicanalista,<br />

filosofo e escritor francês Jean-bertrand Pontalis (1924-2013), nunca deixará de se chocar com a visão<br />

essencialmente analítica de Sigmund Freud, fundada em pares sempre inconciliáveis, ao contrário dos “vasos<br />

comunicantes” de André Breton. Porém tal confronto não deixou de ser frutuoso. Entre o surrealismo e a<br />

psicanálise há um hiato, uma impossibilidade de conjunção, um desencontro que é emblemático das relações<br />

entre a psicanálise e a arte em geral, mas este encontro manco, justamente por fracassado, deixou nos dois<br />

campos profundas marcas, incitando-os a transformações e criações, em um jogo de influências mútuas.<br />

Seguramente, os entrecruzamentos dos dois campos vão além da utilização de “temas” psicanalíticos<br />

em obras de arte ou do eventual interesse investigativo da psicanálise por determinada obra e/ou autor. Eles<br />

produziram, dando-se em um mesmo quadro histórico, verdadeiras transformações nas produções artísticas e<br />

psicanalíticas. Com o surrealismo, essa complexa e sutil relação é particularmente visível, graças ao fato de<br />

seu projeto, teorizado principalmente por André Breton, mas com consequências importantes nas artes<br />

plásticas/visuais, ter a psicanálise como uma de suas bases explícitas. Ainda que tomada de forma mítica ou<br />

poética – ou seja, destituindo Sigmund Freud, o pai, para retomá-lo em uma versão própria e necessariamente<br />

ficcional, à maneira do que fez o poeta no mito de Totem e tabu –, a psicanálise serviu de trampolim, por assim<br />

dizer, para experiências formais determinantes para a produção artística da segunda metade do século XX.<br />

Assim sendo, a psicanálise marcou a arte do século XX e provavelmente sua influência, ainda que<br />

desencontrada, continuará a se fazer presente no futuro. As artes modernas e pós-modernas – muito bem<br />

analisadas por autores como Giulio Carlo Argan (1992), Herschel Browning Chipp (1993) e Michael Archer<br />

(2002) –, por sua vez, vêm deixando na psicanálise traços profundos, apesar de todas as reticências de Sigmund<br />

Freud a respeito das vanguardas de seu tempo. É, pois, com Jacques-Marie Émile Lacan (1901-1981) (mais<br />

conhecido por Jacques Lacan), o maior teórico do descentramento do sujeito, que essa influência se tornou<br />

sensível.<br />

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