30.10.2017 Views

Anais DCIMA Final-1

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Página 689<br />

mantimentos com preços exagerados e os seringalistas repassavam nos barracões<br />

os mesmos mantimentos por preços mais altos ainda. (LESSA, 1991, p.28)<br />

3. O seringal como a “pieuvre” monstruosa: revisitando Victor Hugo<br />

No percurso de análise do ensaio “Entre os seringais”, mais precisamente nos oito últimos parágrafos,<br />

passadas as primeiras descrições referentes à construção do seringal, Euclides da Cunha passa a evidenciar<br />

suas impressões das “estradas” no plano geral dessa organização do espaço de trabalho. Interessante perceber<br />

a relação feita pelo autor na associação das estradas a tentáculos de um polvo:<br />

Busca então o mateiro um outro lugar, inteligentemente escolhido, e reproduz a<br />

mesma operação, até que, estudado o terreno, fique completamente repartido o<br />

seringal como o revela este esboço, onde, presas pelos varadouros do barracão<br />

erguido à beira do rio, se veem as barracas e as estradas que as envolvem,<br />

contorcidas à maneira de tentáculos de um polvo desmesurado. (CUNHA, 2000,<br />

p.335)<br />

Tal associação atrela-se à própria ideia já apontada pelo autor de floresta como dédalo e prisão, uma<br />

vez que ao considerar a expressão “as estradas são tentáculos” fica evidente a metáfora de restrição da<br />

liberdade, concretizando-se no vocábulo maniatado muito usado em seus textos amazônicos. Nesse cenário<br />

constritor, o seringueiro é pois aprisionado por esse polvo, ou seja, pelo seringal. Em passagem singular,<br />

Euclides da Cunha sintetiza o que aqui denominou-se de metáfora do polvo:<br />

A pieuvre assombradora tem, como a sua miniatura pelágica, uma boca<br />

insaciável servida de numerosas voltas constritoras; e só o larga quando, extintas<br />

todas as ilusões, esfolhadas uma a uma todas as esperanças, queda-se um dia,<br />

inerte, num daqueles tentáculos, o corpo repugnante de um esmaleitado, caindo<br />

no absoluto abandono. Considerai a disposição das ‘estradas’. É o diagrama da<br />

sociedade nos seringais, caracterizando-lhe um dos mais funestos atributos, o da<br />

dispersão obrigatória. (CUNHA, 2000, p.335)<br />

Atentando-se a essa passagem, um campo de significações descortina-se no horizonte de interpretação<br />

do espaço amazônico pretendido por Euclides da Cunha. Valendo-se do uso de adjetivos para compor um<br />

cenário a certo ponto desolador, a exemplo dos vocábulos assombradora, pelágica, insaciável, repugnante,<br />

funestos, o autor considera, pois a exemplo de um mostro marinho a situação análoga do seringal, sendo as<br />

estradas verdadeiros tentáculos, que prendem o seringueiro até sufocá-lo, o que seria plausível uma vez que<br />

esses indivíduos, pelo olhar de Euclides da Cunha, estariam em situação análoga à escravidão.<br />

Universidade Federal do Maranhão – Cidade Universitária Dom Delgado<br />

Avenida dos Portugueses, 1.966 - São Luís - MA - CEP: 65080-805

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!