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Anais DCIMA Final-1

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Página 572<br />

Moscou tocou-se e você não?<br />

Você só vai entrar em frias<br />

caso persista em seus enganos.<br />

As horas nunca o perdoarão:<br />

horas que estão limando os dias,<br />

dias que estão roendo os anos.<br />

(ASCHER, 2005, p.114)<br />

O poema de Ascher também chama atenção pela sua estruturação. Na forma de soneto o poema já<br />

realiza uma conexão com moldes clássicos que sobreviveram a tantas desconstruções, por exemplo, da época<br />

vanguardista. Outro ponto é a revisitação ao topos da fugacidade da vida que já pode ser percebido seus<br />

vestígios em sentenças que passam a ideia de movimento e velocidade como “ave-bala”, “voe”, “cruza a reta”,<br />

“carro de corrida” relacionadas ao primeiro verso da segunda estrofe que as compara à rápida passagem da<br />

vida. A comparação com esse último pode ser visto como uma atualização do topos que carrega a marca do<br />

tempo do autor, se os poetas clássicos costumavam relacionar à natureza, mais precisamente à rosa/flor com a<br />

efemeridade do tempo, Nelson Ascher compara ao carro de corrida, que aparece em contexto moderno.<br />

A terceira estrofe parece fazer um convite ao interlocutor para que use com sapiência os dias que ainda<br />

restam, caso contrário, “só vai entrar em fria”. A quarta estrofe alerta para a sorrateira passagem da vida usando<br />

medidas de tempo de forma crescente (horas, dias, anos), assim como o título do poema, que nos avisa que<br />

primeiro perdemos algumas horas, que se somam em dias que se acumulam em anos corroídos pelo tempo e<br />

mal aproveitados.<br />

Assim como no poema de Ascher, a poesia contemporânea continua a contemplar o lugar-comum no<br />

poema “Autoretrato” do poeta recém-eleito membro imortal da academia brasileira de letras Geraldo Carneiro.<br />

Autoretrato<br />

Não sei mais quase nada do que fui.<br />

Toda memória vai virando escombros.<br />

Hoje me reconheço mais nos outros<br />

Poetas que frequento desde sempre<br />

A face deles segue imperturbada<br />

Enquanto eu sofro as erosões do tempo.<br />

Todo poeta nasce um pouco póstumo<br />

Como volúpia de vencer a morte.<br />

A morte, esse ser vasto e corrosivo<br />

Universidade Federal do Maranhão – Cidade Universitária Dom Delgado<br />

Avenida dos Portugueses, 1.966 - São Luís - MA - CEP: 65080-805

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