História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine
História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine
História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
a reali<strong>da</strong>de ultima <strong>da</strong>s coisas?" Socrates, ao<br />
contririo, procura responder i questio: "0<br />
que C a natureza ou reali<strong>da</strong>de dtima do<br />
homem?", ou seja: "0 que C a esshcia do<br />
homem?". A resposta C, finalmente, precisa<br />
e inequivoca: o homem e' a sua alma, en-<br />
quanto C precisamente sua alma que o dis-<br />
tingue especificamente de qualquer outra<br />
coisa. E por "alma" Socrates entende a nossa<br />
raz5o e a sede de nossa ativi<strong>da</strong>de pensante e<br />
eticamente operante. Em poucas palavras:<br />
para Socrates a alma C o eu consciente, ou<br />
seja, a conscibncia e a personali<strong>da</strong>de inte-<br />
lectual e moral. Consequentemente, com<br />
essa descoberta, como foi justamente salien-<br />
tado, Socrates criou a tradigzo moral e inte-<br />
lectual sobre a qua1 a Europa espiritualmen-<br />
te se construiu.<br />
E evidente que, se a esstncia do homem<br />
C a alma, cui<strong>da</strong>r de si mesmo significa cui-<br />
<strong>da</strong>r <strong>da</strong> propria alma mais do que do corpo.<br />
E ensinar os homens a cui<strong>da</strong>rem <strong>da</strong> propria<br />
alma C a tarefa suprema do educador, preci-<br />
samente a tarefa que Socrates considera ter<br />
recebido de Deus, como se 1i na Apologia:<br />
"Que esta (...) C a ordem de Deus; e estou<br />
persuadido de que n5o hi para v6s maior<br />
bem na ci<strong>da</strong>de do que esta minha obedih-<br />
cia a Deus. Na ver<strong>da</strong>de, n5o C outra coisa o<br />
que fago nestas minhas an<strong>da</strong>nqas a n5o ser<br />
persuadir a vos, jovens e velhos, de que nio<br />
deveis cui<strong>da</strong>r do corpo, nem <strong>da</strong>s riquezas,<br />
nem de qualquer outra coisa antes e mais<br />
do que <strong>da</strong> alma, de mod0 que ela se torne<br />
otima e virtuosissima; e de que n5o C <strong>da</strong>s<br />
riquezas que nasce a virtude, mas <strong>da</strong> virtu-<br />
de nascem a riqueza e to<strong>da</strong>s as outras coisas<br />
que s5o bens para os homens, tanto indivi-<br />
dualmente para os ci<strong>da</strong>dios como para o<br />
Estado."<br />
Urn dos raciocinios fun<strong>da</strong>mentais de<br />
Socrates para provar essa tese C o seguinte:<br />
uma coisa C o "instrumento" que se usa e<br />
outra C o "sujeito" que usa o instrumento.<br />
Ora, o homem usa o pr6prio corpo como<br />
instrumento, o que significa que o sujeito,<br />
que C o homem, e o instrumento, que C o<br />
corpo, s5o coisas distintas. Assim, a pergun-<br />
ta "o que C o homem?", nio se pode res-<br />
ponder que C o seu corpo, mas sim que C<br />
"aquilo que se serve do corpo". Mas "o que<br />
se serve do corpo C a psyche', a alma (= a<br />
inteligtncia)", de mod0 que a conclusio C<br />
inevitivel: "A alma nos ordena conhecer<br />
aquele que nos adverte: Conhece a ti mes-<br />
mo." S6crates levou esta sua doutrina a tal<br />
ponto de conscihcia e de reflex50 critica<br />
Capitulo quarto - S6crates e os Socr6ticos menores<br />
que chegou a deduzir to<strong>da</strong>s as conseqiih-<br />
cias que logicamente dela brotam, como ve-<br />
remos.<br />
0 novo significado<br />
de "vilrt~de~~<br />
e o novo qMadro dos valores<br />
Aquilo que hoje chamamos de "virtu-<br />
de" os gregos denominavam arete', signifi-<br />
cando aquilo que torna uma coisa boa e<br />
perfeita naquilo que C; ou, melhor ain<strong>da</strong>,<br />
arete' significa a ativi<strong>da</strong>de ou mod0 de ser<br />
que aperfeiGoa ca<strong>da</strong> coisa, fazendo-a ser<br />
aquilo que deve ser. (0s gregos, portanto,<br />
falavam de virtude dos varios instrumentos,<br />
de virtude dos animais etc. Por exemplo: a<br />
"virtude" do c50 C a de ser um born guar-<br />
diio, a do cavalo C a de correr velozmente e<br />
assim por diante.) Consequentemente, a<br />
"virtude" do homem outra nio pode ser<br />
sen50 aquilo que faz com que a alma seja<br />
tal como sua natureza determina que seja,<br />
isto C, boa e perfeita. E, segundo Socrates,<br />
esse elemento C a "ciEncia" ou o "conheci-<br />
mento", ao passo que o "vicio" seria a pri-<br />
va@o de ciincia ou de conhecimento, ou<br />
seja, a "ignorincia".<br />
Desse modo, Socrates opera uma re-<br />
voluqZo no tradicional quadro de valores.<br />
0s ver<strong>da</strong>deiros valores nio s5o os ligados<br />
is coisas exteriores, como a riqueza, o po-<br />
der, a fama, e tampouco os ligados ao cor-<br />
po, como a vi<strong>da</strong>, o vigor, a saude fisica e a<br />
beleza, mas somente os valores <strong>da</strong> alma, que<br />
se resumem, todos, no "conhecimento".<br />
Naturalmente, isso nio significa que todos<br />
os valores tradicionais tornam-se necessaria-<br />
mente "desvalores"; significa, simplesmen-<br />
te, que "em si mesmos nio tim valor". Tor-<br />
nam-se ou n50 valores somente se forem<br />
usados como o "conhecimento" exige, ou<br />
seja, em fungiio <strong>da</strong> alma e de sua arete'; em<br />
si mesmos, nem uns nem outros tEm valor.<br />
0 s paradoxes<br />
<strong>da</strong> ktica socr6tica<br />
A tese socritica que apresentamos im-<br />
plicava duas conseqiiCncias, que foram logo<br />
considera<strong>da</strong>s como "paradoxos", mas que