12.05.2013 Views

História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine

História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine

História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

E precisamente a esse "prestar contas<br />

<strong>da</strong> pr6pria vi<strong>da</strong>", que era o fim especifico<br />

do mCtodo dialitico, C que S6crates atribui<br />

a ver<strong>da</strong>deira raziio que lhe custou a vi<strong>da</strong>:<br />

para muitos, calar %crates pela morte sig-<br />

nificava libertar-se de ter que "desnu<strong>da</strong>r a<br />

pr6pria alma". Mas o processo posto em<br />

movimento por S6crates ja se tornara ir-<br />

reversivel. A supressiio fisica de sua pessoa<br />

nio podia mais, de mod0 algum, deter esse<br />

processo.<br />

E agora que estabelecemos a finali<strong>da</strong>-<br />

de do "mCtodoV socratico, devemos identi-<br />

ficar sua estrutura.<br />

A dialCtica de S6crates coincide com o<br />

seu pr6prio dialogar (dia-logos), que consta<br />

de dois momentos essenciais: a "refutaqiio"<br />

e a "maiGutica". Ao fazt-lo, S6crates valia-<br />

se <strong>da</strong> miscara do "niio saber" e <strong>da</strong> temi<strong>da</strong><br />

arma <strong>da</strong> "ironia". Ca<strong>da</strong> um desses pontos<br />

deve ser adequa<strong>da</strong>mente compreendido.<br />

0s Sofistas mais famosos relacionavam-se<br />

com os ouvintes na soberba atitude<br />

de quem sabe tudo. Socrates, ao contririo,<br />

colocava-se diante dos interlocutores na atitude<br />

de quem niio sabe e de quem tem tudo<br />

a aprender.<br />

To<strong>da</strong>via, cometeram-se muitos equivocos<br />

em relaqiio a esse "niio saber" socratico,<br />

a ponto de se ver nele o inicio do ceticismo.<br />

Na reali<strong>da</strong>de, ele pretendia ser uma afirmaqio<br />

de ruptura:<br />

a) em relaqio ao saber dos Naturalistas,<br />

que se revelara viio;<br />

b) em relaqio ao saber dos Sofistas, que<br />

logo se revelara mera presunqiio;<br />

c) em relaqio ao saber dos politicos e<br />

dos cultores <strong>da</strong>s varias artes, que quase sempre<br />

se revelava inconsistente e acritico.<br />

Ha mais, porCm. 0 significado <strong>da</strong> afirma~iio<br />

do niio-saber socritico pode ser avaliado<br />

mais exatamente se, alCm de relacionalo<br />

com o saber dos homens, o relacionarmos<br />

tambCm com o saber de Deus. Como veremos,<br />

para S6crates Deus C onisciente, e seu<br />

conhecimento estende-se do universo ao<br />

homem, sem qualquer espCcie de restriqiio.<br />

Ora, C precisamente quando comparado com<br />

a estatura desse saber divino que o saber<br />

humano mostra-se em to<strong>da</strong> a sua fragili<strong>da</strong>de<br />

e pequenez. E, nessa otica, nio apenas<br />

Capitulo quarto - Sbcrates e 0s Socr6ticos menores<br />

aquele saber ilus6rio de que falamos, mas<br />

tambim a prdpria sabedoria humana socrh-<br />

tica revela-se urn niio-saber.<br />

De resto, na Apologia, interpretando<br />

a sentenqa do Oraculo de Delfos, segundo<br />

o qual ninguCm era mais sibio do que<br />

Socrates, o pr6prio Socrates explicita esse<br />

conceito: "Unicamente Deus C sibio. E C isso<br />

o que ele quer significar em seu oriculo: a<br />

sabedoria do homem pouco ou na<strong>da</strong> vale.<br />

Considerando S6crates como sibio, nio<br />

quer se referir, creio eu, propriamente a mim,<br />

Sbcrates, mas sompte usar o meu nome co-<br />

mo um exemplo. E quase como se houvesse<br />

querido dizer: 'Homens, C sapientissimo<br />

dentre v6s aquele que, como %crates, tiver<br />

reconhecido que, na ver<strong>da</strong>de, sua sabedoria<br />

niio tem valor.' "<br />

A contraposiqiio entre "saber divino"<br />

e "saber humano" era uma <strong>da</strong>s antiteses<br />

muito caras a to<strong>da</strong> a sabedoria proveniente<br />

<strong>da</strong> GrCcia e que Socrates, portanto, volta a<br />

reafirmar.<br />

Por fim, devemos salientar o poderoso<br />

efeito ir6nico de benifico abalo que o princi-<br />

pio do niio-saber provocava nas relaq6es corn<br />

o interlocutor: provocava o atrito do qual<br />

brotava a centelha do dialogo.<br />

A ironia C a caracteristica peculiar <strong>da</strong><br />

dialitica socratica, nao apenas do ponto de<br />

vista formal, mas tambCm do ponto de vis-<br />

ta substancial. Em geral, ironia significa "si-<br />

mulaqio". Em nosso caso especifico, indica<br />

o jogo brincalhiio, multiplo e variado <strong>da</strong>s<br />

ficqhes e dos estratagemas realizados por<br />

S6crates para levar o interlocutor a <strong>da</strong>r conta<br />

de si mesmo.<br />

Em suma: a brincadeira esti sempre em<br />

funqso de um objetivo sCrio e, portanto, 6<br />

sempre metddica.<br />

Note-se que, As vezes, em suas simula-<br />

q6es irhicas, S6crates fingia at6 mesmo aco-<br />

lher como pr6prios os mitodos do interlo-<br />

cutor, especialmente quando este era homem<br />

de cultura, particularmente um fil6sof0, e<br />

brincava de engrandecG-10s at6 o limite <strong>da</strong><br />

caricatura, para derrubi-10s com a mesma<br />

16gica que lhes era pr6pria e amarra-10s na<br />

contradiqiio.<br />

To<strong>da</strong>via, sob as varias mascaras que<br />

S6crates segui<strong>da</strong>mente assumia, eram sem-

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!