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História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine

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loo Terceira parte - A descobevta do hornern<br />

surgiria uma Providcncia que se ocupa com<br />

o individuo enquanto tal.<br />

Entre as acusag6es contra Socrates es-<br />

tava tambCm a de que era culpado "de in-<br />

troduzir novos <strong>da</strong>imdnia", novas enti<strong>da</strong>des<br />

divinas. Na Apologia Socrates diz, a prop6<br />

sito <strong>da</strong> questiio: "A raziio (.. .) C aquela que<br />

muitas vezes e em diversas circunstincias<br />

ouvistes dizer, ou seja, que em mim se veri-<br />

fica algo de divino e demoniaco, precisamen-<br />

te aquilo que Melito (o acusador), jocosa-<br />

mente, escreveu no seu ato de acusagiio: C<br />

como uma voz que se faz ouvir dentro de<br />

mim desde quando era menino e que, quan-<br />

do se faz ouvir, sempre me impede de fazer<br />

aquilo que estou a ponto de fazer, mas que<br />

nunca me exorta a fazer."<br />

0 <strong>da</strong>imdnion socritico era, portanto,<br />

"uma voz divina" que lhe vetava determi-<br />

na<strong>da</strong>s coisas: ele o interpretava como espC-<br />

cie de sortiligio, que o salvou virias vezes<br />

dos perigos ou de experihcias negativas.<br />

0s estudiosos ficaram muito perplexos<br />

diante desse <strong>da</strong>imdnion, e as exegeses que<br />

dele foram propostas sio as mais dispares.<br />

Alguns pensaram que S6crates estivesse iro-<br />

nizando, outros falaram de voz <strong>da</strong> cons-<br />

cihcia, outros do sentimento que perpassa<br />

o ghio. E at6 se poderia incomo<strong>da</strong>r a psi-<br />

quiatria para entender a "voz divina" como<br />

fato patol6gico ou entio interpelar as cate-<br />

gorias <strong>da</strong> psicanilise. Mas C claro que, as-<br />

sim fazendo, caimos no arbitrio.<br />

Se quisermos nos limitar aos fatos, de-<br />

vemos dizer o que segue.<br />

Em primeiro lugar, deve-se destacar que<br />

o <strong>da</strong>imdnion na<strong>da</strong> tem a ver com o campo<br />

<strong>da</strong>s ver<strong>da</strong>des filosoficas. Com efeito, a "voz<br />

divina" interior nio revela em absoluto a<br />

Socrates a "sabedoria humana" de que ele<br />

C portador, nem qualquer <strong>da</strong>s propostas ge-<br />

rais ou particulares de sua Ctica. Para S6cra-<br />

tes, os principios filosoficos extraem sua va-<br />

li<strong>da</strong>de do logos e nzo <strong>da</strong> revelagiio divina.<br />

Em segundo lugar, S6crates n8o relacio-<br />

nou com o <strong>da</strong>imdnion nem mesmo sua opgio<br />

moral de fundo, que, no entanto, considera<br />

provir de uma ordem divina. 0 <strong>da</strong>imdnion<br />

niio lhe "ordenava", mas Ihe "vetava".<br />

Excluidos os campos <strong>da</strong> filosofia e <strong>da</strong><br />

opgzo ttica de fundo, resta apenas o campo<br />

dos eventos e ap5es particulares. E exata-<br />

mente a esse campo que se referem todos os<br />

textos 5 disposigio sobre o <strong>da</strong>imdnion so-<br />

critico. Trata-se, portanto, de um fato que diz<br />

respeito ao individuo Socrates e aos aconte-<br />

cimentos particulares de sua existcncia: era<br />

um "sinal" que, como dissemos, o impedia<br />

de fazer coisas particulares que Ihe teriam<br />

acarretado prejuizos. A coisa <strong>da</strong> qual o afas-<br />

tou mais firmemente foi a participasio ati-<br />

va na vi<strong>da</strong> politica.<br />

Em suma, o <strong>da</strong>imdnion i algo que diz<br />

respeito i personali<strong>da</strong>de excepcional de<br />

Socrates, devendo ser posto no mesmo pla-<br />

no de certos momentos de concentragiio<br />

muito intensa, bastante pr6ximos aos arre-<br />

batarnentos de gxtase em que Socrates mer-<br />

gulhava algumas vezes e que duravam lon-<br />

gamente, coisa <strong>da</strong> qual nossas fontes falam<br />

expressamente. Portanto, o <strong>da</strong>imdnion nio<br />

deve ser relacionado com o pensamento e a<br />

filosofia de S6crates: ele pr6prio manteve<br />

as duas coisas distintas e separa<strong>da</strong>s - e o<br />

mesmo deve fazer o intirprete.<br />

0 mktodo dialktico<br />

de Sbcrates<br />

e sMa finali<strong>da</strong>de<br />

0 mCtodo e a dialktica de Socrates tam-<br />

bCm estio ligados a sua descoberta <strong>da</strong> es-<br />

&cia do homem como psychk, porque ten-<br />

dem de mod0 consciente a despojar a alma<br />

<strong>da</strong> ilusio do saber, curando-a dessa manei-<br />

ra a fim de torna-la id6nea a acolher a ver-<br />

<strong>da</strong>de. Assim, as finali<strong>da</strong>des do mitodo<br />

socratico sHo fun<strong>da</strong>mentalmente de nature-<br />

za Ctica e educativa, e apenas secundiria e<br />

mediatamente de natureza logica e gnosio-<br />

logica.<br />

Em suma: dialogar com Socrates leva-<br />

va a um "exame <strong>da</strong> alma" e a uma presta-<br />

$20 de contas <strong>da</strong> propria vi<strong>da</strong>, ou seja, a um<br />

"exame moral", como bem destacavam seus<br />

contemporineos. Podemos ler em um teste-<br />

munho plat6nico: "Quem quer que esteja<br />

proximo de Socrates e em contato com ele<br />

para raciocinar, qualquer que seja o assun-<br />

to tratado, C arrastado pelas espirais do dis-<br />

curso e inevitavelmente forgado a seguir<br />

adiante, at6 ver-se prestando contas de si<br />

mesmo, dizendo inclusive de que mod0 vive<br />

e de que mod0 viveu. E, uma vez que se viu<br />

assim, Socrates niio mais o deixa".

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