12.05.2013 Views

História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine

História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine

História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

138 Quarta parte - Plai60<br />

QI 0 significado metafisico<br />

<strong>da</strong> "segun<strong>da</strong> navegac&o"<br />

Existe um ponto fun<strong>da</strong>mental <strong>da</strong> filo-<br />

sofia plat6nica de cuja formulaqio depen-<br />

dem por inteiro a nova disposiqiio de todos<br />

os problemas <strong>da</strong> filosofia e o novo clima<br />

espiritual como pano de fundo de tais pro-<br />

blemas e suas respectivas soluq6es, confor-<br />

me ja observamos. Esse ponto fun<strong>da</strong>mental<br />

consiste na descoberta <strong>da</strong> existsncia de uma<br />

reali<strong>da</strong>de supra-sensivel, ou seja, de uma<br />

dimensio suprafisica do ser (de um genero<br />

de ser nio-fisico), que a filosofia <strong>da</strong> physis<br />

nem mesmo vislumbrara. Todos os Natura-<br />

listas haviam tentado explicar os fen6me-<br />

nos recorrendo a causas de car6ter fisico e<br />

mecinico (igua, ar, terra, fogo, calor, frio,<br />

condensaqio, rarefaggo etc.).<br />

Platio observa que o pr6prio Anaxii-<br />

goras, apesar de ter atinado a necessi<strong>da</strong>de<br />

de introduzir uma Intelighcia universal para<br />

conseguir explicar as coisas, niio soube explo-<br />

rar essa sua intuiqiio, continuando a atribuir<br />

peso preponderante is causas fisicas tradi-<br />

cionais. Entretanto - e esse C o problema<br />

fun<strong>da</strong>mental -, sera que as causas de cari-<br />

ter fisico e mecinico sio as "ver<strong>da</strong>deiras cau-<br />

sas" ou, ao contririo, constituem simples<br />

"con-causas", ou seja, causas a serviqo de<br />

causas ulteriores e mais eleva<strong>da</strong>s? A causa<br />

<strong>da</strong>quilo que C fisico e mecinico nio sera,<br />

talvez, algo que niio i fisico e nio C mecinico?<br />

Para encontrar resposta a esses proble-<br />

mas, Platio empreendeu o que ele pr6prio<br />

simbolicamente denomina de "segun<strong>da</strong> na-<br />

vegaqiio". Na linguagem antiga dos homens<br />

do mar, "segun<strong>da</strong> navegaqiio" se dizia <strong>da</strong>-<br />

quela que se realizava quando, cessado o ven-<br />

to e nio funcionando mais as velas, se re-<br />

corria aos remos. Na imagem plathica, a<br />

primeira navegaqiio simboliza o percurso <strong>da</strong><br />

filosofia realizado sob o impulso do vento<br />

<strong>da</strong> filosofia naturalista. A "segun<strong>da</strong> nave-<br />

gaqio" representa, ao contririo, a contri-<br />

buigiio pessoal de Platio, a navegaqio rea-<br />

liza<strong>da</strong> sob o impulso de suas pr6prias forqas,<br />

ou seja, em linguagem nio metaforica, sua<br />

elaboraqio pessoal. A primeira navegaggo<br />

se revelara fun<strong>da</strong>mentalmente fora de rota,<br />

considerando que os fil6sofos PrC-socriiticos<br />

nio conseguiram explicar o sensivel atravCs<br />

do pr6prio sensivel. Jii a "segun<strong>da</strong> navega-<br />

qio" encontra a nova rota que conduz i<br />

descoberta do supra-sensivel, ou seja, do ser<br />

inteligivel. Na primeira navegaqio, o fi16-<br />

sofo ain<strong>da</strong> permanece prisioneiro dos senti-<br />

dos e do sensivel, enquanto que, na "segun-<br />

<strong>da</strong> navegaqio", Platio tenta a libertaqio<br />

radical dos sentidos e do sensivel e um des-<br />

locamento decidido para o plano do racio-<br />

cinio puro e <strong>da</strong>quilo que C captive1 pelo puro<br />

intelecto e pela pura mente.<br />

Dois exemplos esclarecedores<br />

apresentados por Plat~o<br />

0 sentido dessa "segun<strong>da</strong> navegaqiio"<br />

fica particularmente claro nos exemplos<br />

apresentados pel0 pr6prio Platiio.<br />

Desejamos explicar por que certa coi-<br />

sa C bela? Ora, para explicar esse "porqu:"<br />

o naturalista invocaria elementos puramen-<br />

te fisicos, como a cor, a figura e outros ele-<br />

mentos desse tipo. Entretanto - diz Platio<br />

- nio sHo essas as "ver<strong>da</strong>deiras causas",<br />

mas, ao contririo, apenas meios ou "con-<br />

causas". ImpBe-se, portanto, postular a exis-<br />

tgncia de uma causa ulterior, que, para cons-<br />

tituir ver<strong>da</strong>deira causa, dever6 ser algo nio<br />

sensivel mas inteligivel. Essa causa C a IdCia<br />

ou "forma" pura do Belo em si, a qual, pela<br />

sua participaqiio ou presenqa ou comunhio<br />

ou, de qualquer modo, atravCs de certa re-<br />

laqio determinante, faz com que as coisas<br />

empiricas sejam belas, isto C, se realizem<br />

segundo determina<strong>da</strong> forma, cor e propor-<br />

qio como convim e precisamente como de-<br />

vem ser para que possam ser belas.<br />

E eis um segundo exemplo, nio menos<br />

eloqiiente.<br />

S6crates est5 preso, aguar<strong>da</strong>ndo a con-<br />

denaqio. Por que esti preso? A explicaqio<br />

naturalista-mecanicista nio tem condiq6es<br />

de dizer seniio o seguinte: porque S6crates<br />

possui um corpo composto de ossos e ner-<br />

vos, miisculos e articulaq6es que, com o<br />

afrouxamento e o retesamento dos nervos,<br />

podem mover e flexionar os membros: por<br />

essa raziio %crates teria movido e flexio-<br />

nado as pernas, ter-se-ia dirigido ao carcere<br />

e 16 se encontraria ati o momento. Ora,<br />

qualquer pessoa percebe a inadequaqio desse<br />

tip0 de explicaqiio: ela nio oferece o ver<strong>da</strong>-<br />

deiro "porqu:", a razio pela qual S6crates<br />

estA preso, explicando apenas qual o meio<br />

ou instrumento de que Socrates se serviu

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!