História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine
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0 s escritos<br />
e as "douf~inas 60 escrita~''<br />
e suas rela&es<br />
Especialmente ao longo <strong>da</strong>s ultimas di-<br />
ca<strong>da</strong>s, evidenciou-se um terceiro problema,<br />
o <strong>da</strong>s chama<strong>da</strong>s "doutrinas n5o escritas",<br />
que tornou a quest50 platenica ain<strong>da</strong> mais<br />
complexa e, por varios aspectos, demons-<br />
trou ser de decisiva importgncia. Hoje, mui-<br />
tos estudiosos consideram que <strong>da</strong> solug50<br />
desse problema depende a cornpreens50 cor-<br />
reta do pensamento plathico em geral e <strong>da</strong><br />
propria historia do platonismo na antigui-<br />
<strong>da</strong>de.<br />
Fontes antigas nos referem que, na Aca-<br />
demia, Plat50 ministrou cursos intitulados<br />
Sobre o bem, cujo teor ele n2o quis escre-<br />
ver. Em tais cursos, discorria sobre reali<strong>da</strong>-<br />
des ultimas e supremas, ou seja, sobre os<br />
primeiros principios, adestrando os discipu-<br />
10s para a cornpreens50 desses principios<br />
atraves de rigoroso tirocinio metodico e<br />
dialitico. Plat50 estava convencido de que<br />
essas "reali<strong>da</strong>des ultimas e supremas" n2o<br />
podiam ser transmiti<strong>da</strong>s sen50 mediante<br />
adequa<strong>da</strong> preparag20 e rigorosas observa-<br />
gees, que s6 podem ocorrer no dialogo vivo<br />
e no emprego <strong>da</strong> dialitica oral.<br />
0 proprio Plat50 nos <strong>da</strong> conta disso<br />
em sua Carta VII: "0 conhecimento dessas<br />
coisas nio e' de forma alguma transmissive1<br />
como os outros conhecimentos, mas apenas<br />
apos muitas discuss6es sobre tais coisas e<br />
apos um period0 de vi<strong>da</strong> em comum, quan-<br />
do, de mod0 imprevisto, como luz que se<br />
acende de simples fagulha, esse conhecimen-<br />
to nasce na alma e de si mesmo se alimen-<br />
ta." Em suma, nesse ponto Plat50 mostrou-<br />
se muito firme e sua decis5o foi categ6rica:<br />
"Sobre essas coisas n5o ha nenhum escrito<br />
meu, e nunca havera."<br />
Entretanto, os discipulos que assistiram<br />
is ligdes escreveram essas doutrinas Sobre<br />
o bem e alguns desses escritos chegaram at6<br />
nos. Plat50 desaprovou a iniciativa e, mais<br />
ain<strong>da</strong>, condenou expressamente esses escri-<br />
tos, considerando-os nocivos e inuteis, pe-<br />
las razdes j5 menciona<strong>da</strong>s. Admitiu, porCm,<br />
que alguns desses discipulos haviam com-<br />
preendido bem suas lig6es.<br />
Concluindo, alim dos dialogos escri-<br />
tos, para bem compreender Platso, tambim<br />
precisamos ter presentes as "doutrinas n5o<br />
escritas" que nos foram lega<strong>da</strong>s pela tradi-<br />
Capitulo sexto - Plat60 e a Academia antiga<br />
135<br />
g5o indireta, que se referem justamente i<br />
chave fun<strong>da</strong>mental do sistema. Hoje mui-<br />
tos estudiosos est5o convencidos de que cer-<br />
tos diilogos e sobretudo certas partes de di6-<br />
logos, considera<strong>da</strong>s no passado enigmaticas<br />
ou problematicas, recebem nova luz exata-<br />
mente quando conecta<strong>da</strong>s com as "doutri-<br />
nas n5o escritas".<br />
Em suma, cumpre observar que, alCm<br />
dos diilogos escritos, para compreender<br />
Platgo, devemos remontar is "doutrinas n5o<br />
escritas" expostas nas ligdes ministra<strong>da</strong>s aos<br />
discipulos <strong>da</strong> Academia e compila<strong>da</strong>s sob o<br />
titulo Sobre o bem, que, portanto, devem<br />
constituir ponto de referhcia essencial, a<br />
medi<strong>da</strong>, ao menos, que nos foram transmi-<br />
ti<strong>da</strong>s.<br />
como personagem<br />
dos di610gos<br />
Plat20 recusou-se a escrever sobre os<br />
principios ultimos. Entretanto, mesmo em<br />
relag50 aos temas a respeito dos quais con-<br />
siderou que pudesse escrever, buscou sem-<br />
pre evitar conferir-lhes tratamento "siste-<br />
mitico", procurando reproduzir o espirito<br />
do didogo socratico, cujas peculiari<strong>da</strong>des<br />
buscava imitar. Tentou reproduzir o jogo<br />
de perguntas e respostas, com todos os me-<br />
andros <strong>da</strong> duvi<strong>da</strong>, com as fugazes e impre-<br />
vistas revelagdes que impulsionam para a<br />
ver<strong>da</strong>de sem, porCm, revela-la, convi<strong>da</strong>n-<br />
do a alma do ouvinte a realizar o seu en-<br />
contro com ela, com as rupturas dramaticas<br />
de seqiihcia que preparam para ulteriores<br />
investigagdes: em suma, to<strong>da</strong> aquela di-<br />
niimica tipicamente socratica estava pre-<br />
sente.<br />
Nasceu assim o "dialogo socratico",<br />
que se tornou um gcnero literirio especifi-<br />
co, adotado por numerosos discipulos de<br />
Socrates e por filosofos posteriores, ghe-<br />
ro cujo inventor foi provavelmente Plat50<br />
e do qua1 certamente foi o maior represen-<br />
tante, ou melhor, o unico representante au-<br />
tcntico, porquanto somente em Plat20 C pos-<br />
sivel reconhecer a ver<strong>da</strong>deira natureza do<br />
filosofar socritico que, nos outros escrito-<br />
res, decai ao nivel de mero expediente ma-<br />
neirista.