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História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine

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96<br />

Terceira parte - A de~cobe~ta do howew<br />

siio muito importantes e devem ser oportu-<br />

namente clarifica<strong>da</strong>s.<br />

1) A virtude (ca<strong>da</strong> urna e to<strong>da</strong>s as vir-<br />

tudes: sabedoria, justiqa, fortaleza, temperan-<br />

qa) C citncia (conhecimento), e o vicio (ca<strong>da</strong><br />

um e todos os vicios) C ignorincia.<br />

2) Ningutm peca voluntariamente;<br />

quem faz o mal, fa-lo por ignorincia do bem.<br />

Essas duas proposiq6es resumem tudo<br />

o que foi denominado "intelectua1ismo so-<br />

cratico", enquanto reduzem o bern moral a<br />

um <strong>da</strong>do de conhecimento, urna vez que se<br />

considera impossivel conhecer o bern e niio<br />

fazt-lo. O intelectualismo socriitico influen-<br />

ciou todo o pensamento grego, a ponto de<br />

tornar-se quase um minimo denominador<br />

comum de todos os sistemas, seja na Cpoca<br />

classics, seja na Cpoca helenistica. Entretan-<br />

to, malgrado seu excesso, as duas proposi-<br />

qdes enuncia<strong>da</strong>s conttm algumas instincias<br />

muito importantes.<br />

1) Em primeiro lugar, cabe destacar a<br />

forte carga sintCtica <strong>da</strong> primeira proposi-<br />

qiio. Com efeito, a opiniiio corrente entre os<br />

gregos antes de S6crates (at6 mesmo a dos<br />

Sofistas, que, no entanto, pretendiam ser<br />

"mestres <strong>da</strong> virtude") considerava as diver-<br />

sas virtudes como uma plurali<strong>da</strong>de (uma coi-<br />

sa C a "justiqa", outra a "santi<strong>da</strong>de", outra<br />

a "prud6ncian, outra a "temperanqa", ou-<br />

tra a "sabedoria"), mas <strong>da</strong> qua1 nio sabiam<br />

captar o nexo essencial, ou seja, aquele algo<br />

que faz com que as diversas virtudes sejam<br />

urna uni<strong>da</strong>de (algo que faqa precisamente<br />

com que to<strong>da</strong>s e ca<strong>da</strong> urna sejam "virtu-<br />

des"). AlCm disso, todos viam as diversas<br />

virtudes como coisas fun<strong>da</strong><strong>da</strong>s nos habitos,<br />

no costume e nas convenq6es aceitas pela so-<br />

cie<strong>da</strong>de. Socrates, no entanto, tenta subme-<br />

ter a vi<strong>da</strong> humana e os seus valores ao do-<br />

minio <strong>da</strong> raziio (assim como os Naturalistas<br />

haviam tentado submeter o cosmo e suas ma-<br />

nifestaqdes ao dominio <strong>da</strong> razio). E corno,<br />

para ele, a propria natureza do homem C<br />

sua alma, ou seja, a raziio, e as virtudes siio<br />

aquilo que aperfeiqoa e concretiza plena-<br />

mente a natureza do homem, ou seja, a ra-<br />

zio, entio C evidente que as virtudes reve-<br />

lam-se como urna forma de citncia e de<br />

conhecimento, precisamente porque siio a<br />

citncia e o conhecimento que aperfeiqoam<br />

a alma e a raziio, como j i dissemos.<br />

2) Mais complexas sio as motivaqdes<br />

que estiio na base do segundo paradoxo.<br />

Shcrates, porCm, viu muito bern que o ho-<br />

mem, por sua natureza, procura sempre seu<br />

pr6prio bern e que, quando faz o mal, na<br />

reali<strong>da</strong>de nio o faz porque se trate do mal,<br />

mas porque espera <strong>da</strong>iextrair um bem. Di-<br />

zer que o ma1 C "involuntario" significa que<br />

o homem engana-se ao esperar dele um bern<br />

e que, na reali<strong>da</strong>de, est5 cometendo um err0<br />

de chlculo e, portanto, se enganando. Ou<br />

seja, em ultima aniilise C vitima de "igno-<br />

rincia".<br />

Ora, S6crates tem perfeitamente razio<br />

quando diz que o conhecimento C condiqio<br />

necessaria para fazer o bern (porque, se niio<br />

conhecermos o bem, nio poderemos fazi-<br />

lo), mas engana-se ao considerar que, alCm<br />

de condiqiio necessaria, seja tambCm condi-<br />

qio suficiente. Em suma, %crates cai em<br />

excesso de racionalismo. Com efeito, para<br />

fazer o bern tambCm C necessirio o concur-<br />

so <strong>da</strong> "vontade". Mas os fil6sofos gregos nio<br />

detiveram sua atenqiio na "vontade", que<br />

se tornaria central e essencial na Ctica dos<br />

cristiios. Para Sbcrates, por conseguinte, C<br />

impossivel dizer "vejo e aprovo o melhor, mas<br />

no agir me atenho ao pior", porque quem<br />

vt o melhor necessariamente tambCm o faz.<br />

Em conseqiitncia, para Sbcrates, como para<br />

quase todos os fil6sofos gregos, o pecado se<br />

reduz a um "erro de c~lculo", a um "erro<br />

de raziio", justamente a "ignor2ncian do ver-<br />

<strong>da</strong>deiro bem.<br />

A mais significativa manifestaqiio <strong>da</strong> ex-<br />

celtncia <strong>da</strong> psyche' ou raziio humana se <strong>da</strong> na-<br />

quilo que %crates denominou de "autodo-<br />

minio" (enkrateia), ou seja, no dominio de<br />

si mesmo nos estados de prazer, dor e can-<br />

saqo, no urgir <strong>da</strong>s paix6es e dos impulsos:<br />

"Considerando o autodominio como a base<br />

<strong>da</strong> virtude, ca<strong>da</strong> homem deveria procurar<br />

ti-lo." Substancialmente, o autodominio sig-<br />

nifica dominio <strong>da</strong> prdpria racionali<strong>da</strong>de so-<br />

bre a prdpria animali<strong>da</strong>de, significa tornar<br />

a alma senhora do corpo e dos instintos liga-<br />

dos ao corpo. Conseqiientemente, podemos<br />

compreender perfeitamente que S6crates<br />

tenha identificado expressamente a liber<strong>da</strong>-<br />

de humana com esse dominio <strong>da</strong> raciona-<br />

li<strong>da</strong>de sobre a animali<strong>da</strong>de. O ver<strong>da</strong>deiro<br />

homem livre C aquele que sabe dominar seus<br />

instintos, o ver<strong>da</strong>deiro homem escravo C<br />

aquele que, niio sabendo dominar seus ins-<br />

tintos, torna-se vitima deles.

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