12.05.2013 Views

História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine

História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine

História da Filosofia – Volume 1 - Charlezine

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

0s fil6sofos de Mileto haviam notado<br />

o dinamismo universal <strong>da</strong>s coisas, que nas-<br />

cem, crescem e perecem, bem como do mun-<br />

do, ou melhor, dos mundos submetidos ao<br />

mesmo processo. AlCm disso, haviam pensa-<br />

do o dinamismo como caracteristica essencial<br />

do proprio "principio" que gera, sustenta e<br />

reabsorve to<strong>da</strong>s as coisas. Entretanto, nio<br />

haviam levado adequa<strong>da</strong>mente tal aspect0 <strong>da</strong><br />

reali<strong>da</strong>de ao nivel temitico. E i precisamen-<br />

te isso que Heraclito fez. "Tudo se move",<br />

"tudo escorre" (panta rhei), na<strong>da</strong> permane-<br />

ce imovel e fixo, tudo mu<strong>da</strong> e se transmuta,<br />

sem exceqio. Em dois de seus mais famosos<br />

fragmentos podemos ler: "Nio se pode des-<br />

cer duas vezes no mesmo rio e nio se pode<br />

tocar duas vezes uma substincia mortal no<br />

mesmo estado, pois, por causa <strong>da</strong> impetuo-<br />

si<strong>da</strong>de e <strong>da</strong> veloci<strong>da</strong>de <strong>da</strong> mu<strong>da</strong>nqa, ela se<br />

dispersa e se reline, vem e mi. (...) Nos des-<br />

cemos e nio descemos pel0 mesmo rio, nos<br />

pr6prjos somos e niio somos."<br />

E claro o sentido desses fragmentos: o<br />

rio C "aparentemente" sempre o mesmo, mas,<br />

"na reali<strong>da</strong>de", C constituido por aguas sem-<br />

pre novas e diferentes, que sobrevem e se dis-<br />

persam. Por isso, nio se pode descer duas<br />

vezes na mesrna agua do rio, precisamente<br />

porque ao se descer pela segun<strong>da</strong> vez ji se<br />

trata de outra agua que sobreveio. E tam-<br />

bCm porque nos proprios mu<strong>da</strong>mos: no mo-<br />

mento em que completamos uma imersiio no<br />

rio, j5 nos tornamos diferentes de como Cra-<br />

mos quando nos movemos para nele imergir.<br />

Dessa forma, Heraclito pode muito bem di-<br />

zer que nos entramos e ngo entramos no<br />

mesmo rio. E pode dizer tambCm que nos<br />

somos e n2o somos, porque, para ser aquilo<br />

que somos em determinado momento, deve-<br />

mos n2o-ser-mais aquilo que Cramos no mo-<br />

mento anterior, do mesmo mod0 que, para<br />

continuarmos a ser, devemos continuamente<br />

n20-ser-mais aquilo que somos em ca<strong>da</strong> mo-<br />

mento. E isso, segundo Heraclito, vale para<br />

to<strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de, sem exceqio. DK<br />

f\ doutrina<br />

<strong>da</strong> "C\ar.monia dos contr6rios"<br />

To<strong>da</strong>via, para Heraclito, isso C apenas<br />

a constataqiio de base, o ponto de parti<strong>da</strong><br />

para outras infersncias, ain<strong>da</strong> mais pro-<br />

fun<strong>da</strong>s e argutas. 0 devir ao qua1 tudo esta<br />

destinado caracteriza-se por continua pas-<br />

sagem de um contrario ao outro: as coisas<br />

frias se aquecem, as quentes se resfriam, as<br />

limi<strong>da</strong>s secam, as secas tornam-se umi<strong>da</strong>s,<br />

o jovem envelhece, o vivo morre, mas <strong>da</strong>qui-<br />

lo que esti morto renasce outra vi<strong>da</strong> jovem,<br />

e assim por diante. Ha, portanto, guerra per-<br />

pitua entre os contrarios que se aproximam.<br />

Mas, como to<strong>da</strong> coisa so tem reali<strong>da</strong>de pre-<br />

cisamente no devir, a guerra (entre os opos-<br />

tos) se revela essencial: "A guerra C mZe de<br />

to<strong>da</strong>s as coisas e de to<strong>da</strong>s as coisas C rainha."<br />

Trata-se, porCm, de uma guerra que, ao<br />

mesmo tempo, C paz, e de um contraste que<br />

C, ao mesmo tempo, harmonia. 0 perene<br />

escorrer de to<strong>da</strong>s as coisas e o devir univer-<br />

sal revelam-se como harmonia de contra'-<br />

rios, ou seja, como perene pacificaqgo de<br />

beligerantes, permanente conciliaqio de con-<br />

tendores (e vice-versa): "Aquilo que C opo-<br />

siqiio se concilia, <strong>da</strong>s coisas diferentes nasce<br />

a mais bela harmonia e tudo se gera por meio<br />

de contrastes"; "harmonia dos contrarios,<br />

como a harmonia do arc0 e <strong>da</strong> lira." So-<br />

mente em conten<strong>da</strong> entre si C que os contra-<br />

rios dio sentido especifico um ao outro: "A<br />

doenqa torna doce a saude, a fome torna do-<br />

ce a sacie<strong>da</strong>de e o cansaqo torna doce o re-<br />

POUSO"; "nio se conheceria sequer o nome<br />

<strong>da</strong> justiqa, se nio existisse a ofensa."<br />

Essa "harmonia" e "uni<strong>da</strong>de dos opos-<br />

tos" C o "principio" e, portanto, Deus ou o<br />

divino: "Deus C dia-noite, C inverno-verio,<br />

C guerra-paz, C sacie<strong>da</strong>de-fome."<br />

Heraclito indicou o fogo como "prin-<br />

cipio" fun<strong>da</strong>mental, e considerou to<strong>da</strong>s as<br />

coisas como transformaqoes do fogo. Tam-<br />

bCm C evidente por que Hericlito atribuiu<br />

ao fogo a "natureza" de to<strong>da</strong>s as coisas: o<br />

fogo expressa de mod0 exemplar as carac-<br />

teristicas de mu<strong>da</strong>nqa continua, do con-<br />

traste e <strong>da</strong> harmonia. Com efeito, o fogo<br />

esti continuamente em movimento, C vi<strong>da</strong><br />

que vive <strong>da</strong> morte do combustivel, C conti-<br />

nua transformaqio deste em cinzas, fuma-<br />

qa e vapores, C perene "necessi<strong>da</strong>de e sacie-<br />

<strong>da</strong>de", como diz Heraclito a respeito de seu<br />

Deus.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!