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A história da loucura na idade clássica

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formas no século XVIII já fazem uma antecipação do progresso,<br />

indicando simbolicamente seu termo.<br />

Mas quis o destino, infelizmente, que as coisas fossem mais<br />

complica<strong>da</strong>s. E, de um modo geral, que a <strong>história</strong> <strong>da</strong> <strong>loucura</strong> não<br />

pudesse servir, em caso algum, como justificativa e ciência auxiliar <strong>na</strong><br />

patologia <strong>da</strong>s doenças mentais. A <strong>loucura</strong>, no devir de sua reali<strong>da</strong>de<br />

histórica, tor<strong>na</strong> possível, em <strong>da</strong>do momento, um conhecimento <strong>da</strong><br />

alie<strong>na</strong>ção num estilo de positivi<strong>da</strong>de que a delimita como doença<br />

mental; mas não é este conhecimento que forma a ver<strong>da</strong>de desta<br />

<strong>história</strong>, animando-a secretamente desde sua origem. E se, durante<br />

algum tempo, pudemos acreditar que essa <strong>história</strong> se concluía nele, é<br />

por não ter reconhecido nunca que a <strong>loucura</strong>, como domínio de<br />

experiência, se esgotava no conhecimento médico ou paramédico que<br />

dela se podia extrair. No entanto, o próprio fato do inter<strong>na</strong>mento<br />

poderia servir como prova disso.<br />

E necessário retor<strong>na</strong>r um momento ao que foi a perso<strong>na</strong>gem do<br />

louco antes do século XVII. Existe uma tendência para acreditar que<br />

ele recebeu seu indício individual de um certo humanitarismo médico,<br />

como se a figura de sua individuali<strong>da</strong>de pudesse ser ape<strong>na</strong>s<br />

patológica. Na ver<strong>da</strong>de, bem antes de ter recebido o estatuto médico<br />

que o positivismo lhe atribuiu, o louco havia adquirido — já <strong>na</strong> I<strong>da</strong>de<br />

Média — uma espécie de densi<strong>da</strong>de pessoal. Individuali<strong>da</strong>de <strong>da</strong><br />

perso<strong>na</strong>gem, sem dúvi<strong>da</strong>, mais que do doente. O louco que Tristão<br />

simula ser, o "derivado" que aparece no leu de la Feuillée já têm<br />

valores assaz singulares para constituir papéis e tomar lugar entre as<br />

paisagens mais familiares. O louco não teve necessi<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s<br />

determi<strong>na</strong>ções <strong>da</strong> medici<strong>na</strong> para alcançar seu reino de indivíduo. O<br />

cerco que a I<strong>da</strong>de Média lhe estabeleceu bastou para tanto. Mas esta<br />

individuali<strong>da</strong>de não permaneceu nem estável, nem inteiramente<br />

imóvel. Ela se desfez e, de algum modo, se reorganizou no decorrer<br />

<strong>da</strong> Re<strong>na</strong>scença. Desde o fim <strong>da</strong> I<strong>da</strong>de Média, essa individuali<strong>da</strong>de se<br />

viu desig<strong>na</strong><strong>da</strong> para a solicitude de um certo humanismo médico. Sob<br />

que influência? Não é impossível que o Oriente e o pensamento árabe<br />

tenham representado, aqui, um papel determi<strong>na</strong>nte. Com efeito,<br />

parece que no mundo árabe bem cedo se fun<strong>da</strong>ram ver<strong>da</strong>deiros<br />

hospitais reservados aos loucos: talvez em Fez, já no século VII 23 ,<br />

23 Cf. Jour<strong>na</strong>l o/ Mental Science, X, p. 256.<br />

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