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A história da loucura na idade clássica

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A mendicância é fruto <strong>da</strong> miséria, a qual é resultado de acidentes ocorridos,<br />

seja <strong>na</strong> produção <strong>da</strong> terra, seja no produto <strong>da</strong>s manufaturas, seja <strong>na</strong> alta dos<br />

gêneros, num excedente de população, etc. 65<br />

A indigência tor<strong>na</strong>-se coisa econômica.<br />

Contudo, não contingente — nem desti<strong>na</strong><strong>da</strong> a ser para sempre<br />

suprimi<strong>da</strong>. Há uma certa quanti<strong>da</strong>de de miséria que não se<br />

conseguirá elimi<strong>na</strong>r uma espécie de fatali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> indigência que<br />

deve acompanhar até o fim dos tempos to<strong>da</strong>s as formas <strong>da</strong><br />

socie<strong>da</strong>de, mesmo lá onde todos os ociosos são empregados: "Num<br />

Estado bem gover<strong>na</strong>do, os únicos pobres serão aqueles que <strong>na</strong>scem<br />

<strong>na</strong> indigência ou que nela caem por acidente" 66 . Esse fundo de<br />

miséria é, de certo modo, i<strong>na</strong>lienável: <strong>na</strong>scimento ou acidente<br />

constituem um aspecto que não se poderia evitar. Durante muito<br />

tempo foi impossível conceber um Estado no qual não haveria pobres,<br />

tanto o Estado de necessi<strong>da</strong>de surgia inscrito no destino do homem e<br />

<strong>na</strong> estrutura <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de: proprie<strong>da</strong>de, trabalho e indigência são<br />

termos que permanecem ligados no pensamento dos filósofos até o<br />

século XIX.<br />

Necessário porque não se pode suprimi-lo, esse lado pobre<br />

também é necessário porque tor<strong>na</strong> possível a riqueza. Porque<br />

trabalha e pouco consome, a classe dos necessitados permite que<br />

uma <strong>na</strong>ção se enriqueça, valorizando seus campos, suas colônias e<br />

suas mi<strong>na</strong>s, permite a fabricação de produtos que serão postos à<br />

ven<strong>da</strong> no mundo todo; em suma, um povo seria pobre mesmo não<br />

tendo pobres. A indigência tor<strong>na</strong>-se elemento indispensável ao<br />

Estado. Nela se oculta a vi<strong>da</strong> mais secreta, porém a mais real, de<br />

uma socie<strong>da</strong>de. Os pobres formam a base e a glória <strong>da</strong>s <strong>na</strong>ções. E<br />

sua miséria, que não se poderia suprimir, deve ser exalta<strong>da</strong> e<br />

home<strong>na</strong>gens devem ser-lhes presta<strong>da</strong>s:<br />

Meu objetivo é somente o de atrair uma parte dessa atenção vigilante (a do<br />

poder) para a parcela sofredora do Povo...; o auxílio que lhe é devido está <strong>na</strong><br />

dependência essencial <strong>da</strong> honra e <strong>da</strong> prosperi<strong>da</strong>de de um Império, do qual os<br />

pobres são por to<strong>da</strong> parte o mais sólido sustentáculo, pois um soberano não<br />

pode conservar e ampliar seu domínio sem favorecer a população, a cultura<br />

<strong>da</strong>s Terras, as Artes e o Comércio; e os Pobres são os agentes necessários<br />

dessas grandes potências que estabelecem a ver<strong>da</strong>deira força de um Povo 67 .<br />

65 BRISSOT DE WARVILLE, Théorie des lois criminelles, 1781, I, p. 79.<br />

66 Encyclopédie, verbete «Hospital».<br />

67 Ibid. RÉCALDE, Prefácio, pp. II, III.<br />

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