15.10.2013 Views

A história da loucura na idade clássica

A história da loucura na idade clássica

A história da loucura na idade clássica

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

azão ou <strong>da</strong> ordem, mas do ponto de vista do direito do indivíduo<br />

livre; nenhuma coação, nem mesmo cari<strong>da</strong>de alguma, pode atingilas.<br />

O que se deve providenciar antes de mais <strong>na</strong><strong>da</strong> é a liber<strong>da</strong>de e a segurança<br />

<strong>da</strong>s pessoas; exercendo a beneficência, não se deve violar as regras <strong>da</strong><br />

justiça.<br />

Liber<strong>da</strong>de e razão têm os mesmos limites. Quando a razão é<br />

atingi<strong>da</strong>, a liber<strong>da</strong>de pode ser coagi<strong>da</strong>; e é necessário ain<strong>da</strong> que essa<br />

afecção <strong>da</strong> razão seja exatamente uma <strong>da</strong>s que ameaçam a<br />

existência do sujeito ou a liber<strong>da</strong>de dos outros:<br />

Quando os homens gozam de suas facul<strong>da</strong>des racio<strong>na</strong>is, isto é, quando elas<br />

não são altera<strong>da</strong>s a ponto de comprometer a segurança e a tranqüili<strong>da</strong>de de<br />

outrem, ou de expor a própria pessoa a ver<strong>da</strong>deiros perigos, ninguém, nem<br />

mesmo a socie<strong>da</strong>de, tem o direito de atingir seja como for sua<br />

independência 30 .<br />

Assim se prepara uma definição <strong>da</strong> <strong>loucura</strong> a partir <strong>da</strong>s relações<br />

que a liber<strong>da</strong>de pode manter consigo mesma. As velhas concepções<br />

jurídicas que liberavam o louco de sua responsabili<strong>da</strong>de pe<strong>na</strong>l e o<br />

privavam de seus direitos civis não constituíam uma psicologia <strong>da</strong><br />

<strong>loucura</strong>; essa suspensão <strong>da</strong> liber<strong>da</strong>de pertencia ape<strong>na</strong>s à esfera <strong>da</strong>s<br />

conseqüências jurídicas. Mas, com Cabanis, a liber<strong>da</strong>de tornou-se<br />

uma <strong>na</strong>tureza para o homem; aquilo que impedir legitimamente seu<br />

uso deve necessariamente ter alterado as formas <strong>na</strong>turais que ela<br />

assume no homem. O inter<strong>na</strong>mento do louco, então, não será <strong>na</strong><strong>da</strong><br />

além de um estado de fato, a tradução, em termos jurídicos, de uma<br />

abolição <strong>da</strong> liber<strong>da</strong>de já conquista<strong>da</strong> em nível psicológico. E com essa<br />

recorrência do direito à <strong>na</strong>tureza se vê fun<strong>da</strong>menta<strong>da</strong> a grande<br />

ambigüi<strong>da</strong>de que tanto faz hesitar o pensamento contemporâneo a<br />

respeito <strong>da</strong> <strong>loucura</strong>: se a irresponsabili<strong>da</strong>de se identifica com a<br />

ausência de liber<strong>da</strong>de, não há determinismo psicológico que não<br />

possa inocentar, isto é, não há ver<strong>da</strong>de para a psicologia que não<br />

seja ao mesmo tempo alie<strong>na</strong>ção para o homem.<br />

O desaparecimento <strong>da</strong> liber<strong>da</strong>de, de conseqüência que era,<br />

tor<strong>na</strong>-se fun<strong>da</strong>mento, segredo, essência <strong>da</strong> <strong>loucura</strong>. E é esta essência<br />

que deve prescrever o que se deve impor como restrição à liber<strong>da</strong>de<br />

material dos insensatos. Impõe-se um controle que deverá interrogar<br />

a <strong>loucura</strong> sobre ela mesma, e para o qual se convocará de modo<br />

30 Vues sur les secours publics; in Dessores philosophiques de CABANIS, Paris,<br />

1956, P II, p.49.<br />

479

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!