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A história da loucura na idade clássica

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ver<strong>da</strong>de do mundo exterior deve passar, depois <strong>da</strong> que<strong>da</strong>, pelo<br />

caminho difícil e muitas vezes deformante dos sentidos, do mesmo<br />

modo a posse <strong>da</strong> razão depende de um "estado físico <strong>da</strong> máqui<strong>na</strong>" 24 e<br />

de todos os efeitos mecânicos que podem ser exercidos sobre ela.<br />

Tem-se aí como que a versão simultaneamente <strong>na</strong>turalista e teológica<br />

dos velhos temas <strong>da</strong> Re<strong>na</strong>scença, que ligavam a <strong>loucura</strong> a todo um<br />

conjunto de dramas e ciclos cósmicos.<br />

Mas dessa apreensão global de uma dependência irá isolar-se<br />

uma nova noção: sob o efeito de uma inquietação ca<strong>da</strong> vez maior, <strong>da</strong><br />

ligação com as constantes ou as grandes circulari<strong>da</strong>des do universo,<br />

o tema <strong>da</strong> <strong>loucura</strong> aparenta<strong>da</strong> com as estações do mundo desdobra-<br />

se aos poucos <strong>na</strong> idéia de uma dependência em relação a um<br />

elemento particular do cosmos. O medo se faz mais urgente; a<br />

intensi<strong>da</strong>de afetiva de tudo aquilo que reage à <strong>loucura</strong> não deixa de<br />

aumentar: tem-se a impressão de que então se isola do todo cósmico<br />

e de sua estabili<strong>da</strong>de sazo<strong>na</strong>l um elemento independente, relativo,<br />

móvel, submetido a uma progressão constante ou a uma aceleração<br />

contínua, e que está encarregado de prestar contas dessa<br />

multiplicação incessante, desse grande contágio <strong>da</strong> <strong>loucura</strong>. Do<br />

macrocosmo, considerado como lugar <strong>da</strong>s cumplici<strong>da</strong>des de todos os<br />

mecanismos e conceito geral de suas leis, isola-se aquilo que se<br />

poderia chamar, numa antecipação ao vocabulário do século XIX, um<br />

"meio".<br />

Sem dúvi<strong>da</strong>, deve-se deixar nessa noção, que ain<strong>da</strong> não<br />

encontrou nem seu equilíbrio nem sua denomi<strong>na</strong>ção fi<strong>na</strong>l, aquilo que<br />

ela pode ter de inconcluso. Falemos antes, com Buffon, de "forças<br />

penetrantes", que não ape<strong>na</strong>s permitem a formação do indivíduo<br />

como também o aparecimento <strong>da</strong>s varie<strong>da</strong>des <strong>da</strong> espécie huma<strong>na</strong>:<br />

influência do clima, diferença <strong>da</strong> alimentação e <strong>da</strong> maneira de viver 25 .<br />

Noção negativa, noção "diferencial" que aparece no século XVIII a fim<br />

de explicar as variações e as doenças, mais do que as a<strong>da</strong>ptações e<br />

as convergências. Como se essas "forças penetrantes" formassem o<br />

outro lado, o negativo, <strong>da</strong>quilo que se tor<strong>na</strong>rá, a seguir, a noção<br />

positiva de meio.<br />

24 Cf. MONTESQUIEU, Causes qui peuvent affecter les esprits et les caractères,<br />

Oeuvres complètes, Pléiade, II, pp. 39-40.<br />

25 BUFFON, Histoire <strong>na</strong>turelle, Oeuvres complètes, 1848, III, «De l'homme», pp.<br />

319-320.<br />

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