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A história da loucura na idade clássica

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desse trabalho em profundi<strong>da</strong>de, que constitui um corpo unitário com<br />

todo o conjunto <strong>da</strong> cultura <strong>clássica</strong>. Com efeito, há certas<br />

experiências que o século XVI havia aceitado ou recusado, que ele<br />

havia formulado ou, pelo contrário, deixado à margem, e que agora o<br />

século XVII vai retomar, agrupar e banir com um único gesto,<br />

man<strong>da</strong>ndo-as para o exílio onde estarão próximas <strong>da</strong> <strong>loucura</strong> —<br />

formando com isso um mundo uniforme do Desatino. É possível<br />

resumir essas experiências dizendo que elas to<strong>da</strong>s dizem respeito à<br />

sexuali<strong>da</strong>de em suas relações com a organização <strong>da</strong> família burguesa,<br />

seja <strong>na</strong> profa<strong>na</strong>ção em seus relacio<strong>na</strong>mentos com a nova concepção<br />

do sagrado e dos ritos religiosos, seja <strong>na</strong> "liberti<strong>na</strong>gem", isto é, <strong>na</strong>s<br />

novas relações que começam a se instaurar entre o pensamento livre<br />

e o sistema <strong>da</strong>s paixões. Esses três domínios de experiência<br />

constituem com a <strong>loucura</strong>, no espaço do inter<strong>na</strong>mento, um mundo<br />

homogêneo que é aquele onde a alie<strong>na</strong>ção mental assumirá o sentido<br />

que lhe conhecemos. Ao fi<strong>na</strong>l do século XVIII, tor<strong>na</strong>r-se-á evidente —<br />

uma dessas evidências não formula<strong>da</strong>s — que certas formas de<br />

pensamento "libertino", como a de Sade, têm algo a ver com o delírio<br />

e a <strong>loucura</strong>; admitir-se-á de um modo igualmente fácil que magia,<br />

alquimia, práticas de profa<strong>na</strong>ção ou ain<strong>da</strong> certas formas de<br />

sexuali<strong>da</strong>de mantêm um parentesco direto com o desatino e a doença<br />

mental. Tudo isso entrará para o rol dos signos maiores <strong>da</strong> <strong>loucura</strong>, e<br />

ocupará seu lugar entre suas manifestações mais essenciais. Mas, a<br />

fim de que se constituíssem essas uni<strong>da</strong>des significativas a nossos<br />

olhos, foi necessária essa transformação, realiza<strong>da</strong> pelo classicismo,<br />

<strong>na</strong>s relações que a <strong>loucura</strong> mantém com todo o domínio <strong>da</strong><br />

experiência ética.<br />

Desde os primeiros meses do inter<strong>na</strong>mento, os doentes venéreos<br />

pertencem de pleno direito ao Hospital Geral. Os homens são<br />

man<strong>da</strong>dos para Bicêtre, e as mulheres para a Salpêtrière. Era<br />

proibido aos médicos do Hôtel-Dieu recolhê-los e cui<strong>da</strong>r deles. Se,<br />

excepcio<strong>na</strong>lmente, ali se aceitam as mulheres grávi<strong>da</strong>s, elas que não<br />

esperem ser trata<strong>da</strong>s como as outras: para o parto terão a<br />

assistência ape<strong>na</strong>s de um cirurgião aprendiz. Portanto, o Hospital<br />

Geral deve receber os "estragados", mas não os aceita sem<br />

formali<strong>da</strong>des: é preciso pagar sua dívi<strong>da</strong> para com a moral pública, e<br />

deve-se estar preparado, <strong>na</strong>s sen<strong>da</strong>s do castigo e <strong>da</strong> penitência, para<br />

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