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A história da loucura na idade clássica

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alteração <strong>na</strong> consciência <strong>da</strong> <strong>loucura</strong>; são os asilos de inter<strong>na</strong>mento, as<br />

casas de força e de correição que doravante representam essa<br />

consciência.<br />

E se há algum paradoxo no ato de encontrarem-se loucos <strong>na</strong>s<br />

salas do hospital e insanos entre os correcio<strong>na</strong>is e prisioneiros, não se<br />

trata de modo algum do signo de um progresso em vias de realização,<br />

de um progresso que vai <strong>da</strong> prisão à casa de saúde, do<br />

encarceramento à terapêutica. De fato, os loucos que estão no<br />

hospital desig<strong>na</strong>m, ao longo <strong>da</strong> era <strong>clássica</strong>, um estado de coisas<br />

superado; eles remetem a essa época — do fim <strong>da</strong> I<strong>da</strong>de Média à<br />

Re<strong>na</strong>scença — em que o louco era reconhecido e isolado como tal,<br />

mesmo fora de um estatuto médico preciso. Pelo contrário, os loucos<br />

dos hospitais gerais, <strong>da</strong>s workhouses, <strong>da</strong>s Zuchthäusern, remetem a<br />

uma certa experiência do desatino que é rigorosamente<br />

contemporânea <strong>da</strong> era <strong>clássica</strong>. Se é ver<strong>da</strong>de que existe uma<br />

defasagem cronológica entre essas duas maneiras de tratar os<br />

insanos, não é o hospital que pertence à cama<strong>da</strong> geológica mais<br />

recente; ele constitui, pelo contrário, uma sedimentação arcaica.<br />

Prova é que não deixou de ver-se atraído para as casas de<br />

inter<strong>na</strong>mento por uma espécie de gravitação e que foi como que<br />

assimilado a ponto de ser quase inteiramente confundido com elas. A<br />

partir do dia em que Bethleem, hospital para os lunáticos curáveis, foi<br />

aberto aos que não o eram (1733), não apresentou mais nenhuma<br />

diferença notável em relação a nossos hospitais gerais ou qualquer<br />

outra casa de correição. O próprio Saint Luke, ain<strong>da</strong> que tardiamente<br />

fun<strong>da</strong>do, em 1751, para duplicar Bethleem, não escapa a esta atração<br />

do estilo correcio<strong>na</strong>l. Quando Tuke o visita, ao fi<strong>na</strong>l do século, escreve<br />

no caderno onde anota o que pôde observar:<br />

O superintendente nunca viu muita vantagem <strong>na</strong> prática <strong>da</strong> medici<strong>na</strong>...<br />

Acredita que o seqüestro e a coação podem ser impostos de modo mais<br />

vantajoso a título de punição, e de modo geral acha que o medo é o princípio<br />

mais eficaz para reduzir os loucos a uma conduta orde<strong>na</strong><strong>da</strong> 41 .<br />

A<strong>na</strong>lisar o inter<strong>na</strong>mento, como se faz de modo tradicio<strong>na</strong>l,<br />

atribuindo ao passado tudo o que diz respeito ao aprisio<strong>na</strong>mento e a<br />

um futuro em formação, ao que já permite prever o hospital<br />

psiquiátrico, é trocar os <strong>da</strong>dos do problema. De fato, talvez sob a<br />

influência do pensamento e <strong>da</strong> ciência árabes, os loucos foram<br />

41 Citado por D.H. TUKE, Chapters ia lhe History of the Insane, pp. 9, 90.<br />

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