15.10.2013 Views

A história da loucura na idade clássica

A história da loucura na idade clássica

A história da loucura na idade clássica

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

y u<strong>na</strong> de las señales por donde conjeturaron se moría fue el haber vuelto con<br />

tanta facili<strong>da</strong>d de loco a cuerdo 110 .<br />

Mas a morte, em si mesma, não traz a paz: a <strong>loucura</strong> ain<strong>da</strong><br />

triunfará — ver<strong>da</strong>de irrisoriamente eter<strong>na</strong>, para lá do fim de uma vi<strong>da</strong><br />

que, no entanto, tinha-se libertado <strong>da</strong> <strong>loucura</strong> através desse mesmo<br />

fim. Ironicamente sua vi<strong>da</strong> insa<strong>na</strong> persegue-o e só o imortaliza em<br />

virtude de sua própria demência; a <strong>loucura</strong> ain<strong>da</strong> é a vi<strong>da</strong> imperecível<br />

<strong>da</strong> morte:<br />

Yace aqui el Hi<strong>da</strong>lgo fuerte Que a tanto extremo llegó De valiente, que se<br />

advierte Que la muerte no triunfó De su vi<strong>da</strong> con su muerte 111 .<br />

Mas a <strong>loucura</strong> logo abando<strong>na</strong> essas regiões últimas em que<br />

Cervantes e Shakespeare a tinham situado. E <strong>na</strong> literatura do começo<br />

do século XVII ela ocupa, de preferência, um lugar intermediário:<br />

constitui assim antes o nó que o desenrolar, antes a peripécia que a<br />

derradeira iminência. Desloca<strong>da</strong> <strong>na</strong> economia <strong>da</strong>s estruturas<br />

romanescas e dramáticas, ela autoriza a manifestação <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>de e o<br />

retorno apaziguado <strong>da</strong> razão.<br />

É que ela não mais é considera<strong>da</strong> em sua reali<strong>da</strong>de trágica, no<br />

dilaceramento absoluto que a abre para um outro mundo, mas sim,<br />

ape<strong>na</strong>s, <strong>na</strong> ironia de suas ilusões. Ela não é um castigo real, mas a<br />

imagem do castigo: portanto, uma aparência falsa. Só pode ser<br />

relacio<strong>na</strong><strong>da</strong> com a aparência de um crime ou com a ilusão de uma<br />

morte. Se Ariosto, <strong>na</strong> Loucura do Sábio, tor<strong>na</strong>-se louco ao saber <strong>da</strong><br />

morte <strong>da</strong> filha, é porque ela não está realmente morta. Quando<br />

Erasto, em Mélite, vê-se perseguido pelos Eumênides e levado diante<br />

de Minos, isso acontece em virtude de um duplo crime que ele<br />

poderia ter cometido, que ele gostaria de ter cometido mas que de<br />

fato não provocou nenhuma morte real. A <strong>loucura</strong> é despoja<strong>da</strong> de sua<br />

serie<strong>da</strong>de dramática: ela só é castigo ou desespero <strong>na</strong> dimensão do<br />

erro. Sua função dramática só subsiste <strong>na</strong> medi<strong>da</strong> em que se trata de<br />

um falso drama: é uma forma quimérica, onde só se li<strong>da</strong> com faltas<br />

supostas, assassi<strong>na</strong>tos ilusórios, desaparecimentos desti<strong>na</strong>dos aos<br />

reencontros.<br />

E no entanto esta ausência de serie<strong>da</strong>de não a impede de ser<br />

110 CERVANTES, Dom Quixote, Parte II, Cap. LXXIV, p. 670, ed. Espase-Calpe,<br />

1973 (N. do T.). (E um dos indícios pelos quais conjecturaram que ele morria<br />

foi ter-se transformado com tanta facili<strong>da</strong>de de louco em são.»)<br />

111 Dom Quixote, Parte II, Cap. LXXIV, p. 672,ed. cit. (N. do T.) (Jaz aqui o<br />

Fi<strong>da</strong>lgo forte/Que a tanto extremo chegou/De valentia, que se adverte/Que a<br />

morte não triunfou/Sobre sua vi<strong>da</strong> com sua morte.)<br />

46

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!