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A história da loucura na idade clássica

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esse temor persiste, a alma atribui-lhe mais atenção, isolando-o e<br />

destacando-o ca<strong>da</strong> vez mais de tudo aquilo que não é ela. Mas esse<br />

isolamento reforça-o, e a alma, por ter-lhe <strong>da</strong>do um destino muito<br />

particular, tende a atribuir-lhe progressivamente to<strong>da</strong> uma série de<br />

idéias mais ou menos distante:<br />

Ela acrescenta a essa idéia simples to<strong>da</strong>s as que são capazes de alimentála<br />

e aumentá-la. Por exemplo, um homem que, ao dormir, imagi<strong>na</strong> que<br />

está sendo acusado de um crime, logo associa esta idéia com a de uma<br />

escolta, com a de juízes, carrascos, ca<strong>da</strong>falsos 47 .<br />

E o fato de ver-se assim sobrecarrega<strong>da</strong> com todos esses<br />

elementos novos, de arrastá-los atrás de si, dá à idéia como que um<br />

acréscimo de força que acaba por torná-la irresistível mesmo aos<br />

esforços mais bem organizados <strong>da</strong> vontade.<br />

A <strong>loucura</strong>, que encontra sua possibili<strong>da</strong>de primeira no fato <strong>da</strong><br />

paixão e no desdobramento dessa dupla causali<strong>da</strong>de que, partindo <strong>da</strong><br />

própria paixão, se irradia simultaneamente <strong>na</strong> direção do corpo e <strong>da</strong><br />

alma, a <strong>loucura</strong> é ao mesmo tempo paixão suspensa, ruptura <strong>da</strong><br />

causali<strong>da</strong>de, liberação dos elementos dessa uni<strong>da</strong>de. Ela participa ao<br />

mesmo tempo <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> paixão e <strong>da</strong> a<strong>na</strong>rquia <strong>da</strong>quele que,<br />

posto em movimento por essa mesma paixão, move-se bem adiante<br />

dela, chegando a contestar tudo o que ela pressupõe. Ela acaba por<br />

ser um movimento tão violento dos nervos e dos músculos, que <strong>na</strong><strong>da</strong>,<br />

no curso <strong>da</strong>s imagens, <strong>da</strong>s idéias ou <strong>da</strong>s vontades, parece<br />

corresponder-lhe: é o caso <strong>da</strong> mania, quando bruscamente se<br />

intensifica até às convulsões ou quando degenera definitivamente em<br />

furor contínuo 48 . Inversamente, ela pode, no repouso ou <strong>na</strong> inércia do<br />

corpo, fazer surgir e depois sustentar uma agitação <strong>da</strong> alma, sem<br />

pausas ou apaziguamento, tal como acontece <strong>na</strong> melancolia, onde os<br />

objetos exteriores não produzem sobre o espírito do doente a mesma<br />

impressão que sobre o de um homem sadio;<br />

suas impressões são fracas e raramente ele presta-lhes atenção; seu<br />

espírito é quase totalmente absorvido pela vivaci<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s idéias 49 .<br />

Na ver<strong>da</strong>de, essa dissociação entre os movimentos exteriores do<br />

corpo e o curso <strong>da</strong>s idéias não indica ao certo que a uni<strong>da</strong>de entre o<br />

47 SAUVAGES, Nosologie méthodique, VIII, pp. 21-22.<br />

48 DUFOUR (Essai sur l'entendement, pp. 366-367) admite, com a Encyclopédie,<br />

que o furor não passa de uma gra<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> mania.<br />

49 DE LA RIVE. Sobre um estabelecimento para a cura dos alie<strong>na</strong>dos. Bibliotheque<br />

Britannique, VIII, p. 304.<br />

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