15.10.2013 Views

A história da loucura na idade clássica

A história da loucura na idade clássica

A história da loucura na idade clássica

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Os sentimentos religiosos... atuam sem restrições; todo indivíduo tem a<br />

permissão de pregar a quem quiser ouvi-lo;<br />

e à força de ouvir opiniões tão diferentes, "os espíritos se<br />

atormentam <strong>na</strong> busca <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>de". Perigos <strong>da</strong> indecisão, <strong>da</strong> atenção<br />

que não sabe onde fixar-se, <strong>da</strong> alma que vacila. Perigo também <strong>da</strong>s<br />

querelas, <strong>da</strong>s paixões, do espírito que se fixa obsti<strong>na</strong><strong>da</strong>mente no<br />

partido que tomou:<br />

Ca<strong>da</strong> coisa encontra sua oposição, e a oposição excita os sentimentos; <strong>na</strong><br />

religião, <strong>na</strong> política, <strong>na</strong> ciência e em tudo, permite-se a ca<strong>da</strong> um que escolha<br />

seu lado, mas deve esperar encontrar oposição.<br />

Tanta liber<strong>da</strong>de tampouco permite domi<strong>na</strong>r o tempo: este é<br />

entregue à sua incerteza, e todos são abando<strong>na</strong>dos pelo Estado a<br />

suas flutuações:<br />

Os ingleses constituem uma <strong>na</strong>ção mercantil; o espírito sempre ocupado pelas<br />

especulações é continuamente agitado pelo medo e pela esperança. O<br />

egoísmo, alma do comércio, facilmente se tor<strong>na</strong> invejoso, chamando em seu<br />

auxílio outras facul<strong>da</strong>des.<br />

Aliás, essa liber<strong>da</strong>de está bastante afasta<strong>da</strong> <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>deira<br />

liber<strong>da</strong>de <strong>na</strong>tural: de todos os lados ela é coagi<strong>da</strong> e premi<strong>da</strong> por<br />

exigências opostas aos desejos mais legítimos dos indivíduos: é a<br />

liber<strong>da</strong>de dos interesses, <strong>da</strong>s coalizões, <strong>da</strong>s combi<strong>na</strong>ções fi<strong>na</strong>nceiras,<br />

não do homem, não dos espíritos e dos corações. Por razões de<br />

dinheiro, as famílias são mais tirânicas do que em qualquer outro<br />

lugar; somente as moças ricas conseguem casar,<br />

as outras são reduzi<strong>da</strong>s a outros meios de satisfação que arruí<strong>na</strong>m o corpo e<br />

desorganizam as manifestações <strong>da</strong> alma. A mesma causa favorece a<br />

liberti<strong>na</strong>gem, e esta predispõe à <strong>loucura</strong> 29 .<br />

A liber<strong>da</strong>de mercantil aparece assim como o elemento no qual a<br />

opinião nunca pode chegar à ver<strong>da</strong>de, onde o imediato é entregue<br />

necessariamente à contradição, onde o tempo escapa à apreensão e<br />

à certeza <strong>da</strong>s estações, onde o homem é despojado de seus desejos<br />

pelas leis do interesse. Em suma, a liber<strong>da</strong>de, longe de recolocar o<br />

homem <strong>na</strong> posse de si mesmo, não pára de afastá-lo ca<strong>da</strong> vez mais<br />

de sua essência e de seu mundo; ela o fasci<strong>na</strong> <strong>na</strong> exteriori<strong>da</strong>de<br />

absoluta dos outros e do dinheiro, <strong>na</strong> interiori<strong>da</strong>de irreversível <strong>da</strong><br />

paixão e do desejo i<strong>na</strong>cabado. Entre o homem e a felici<strong>da</strong>de de um<br />

mundo em que ele se reconheceria, entre o homem e uma <strong>na</strong>tureza<br />

29 SPURZHEIM Obsenvations sur la folie, Paris, 1818, pp. 193-196.<br />

401

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!