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A história da loucura na idade clássica

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fi<strong>na</strong>lmente nessa superfície poli<strong>da</strong> do mármore. Os temas clássicos do<br />

inter<strong>na</strong>mento atingem aqui uma perfeição paroxística: o interno é<br />

excluído até a morte, mas ca<strong>da</strong> passo que dá para essa morte se<br />

transforma, numa reversibili<strong>da</strong>de sem resíduos, em coisa útil à<br />

felici<strong>da</strong>de <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de de que é banido 17 .<br />

Quando a Revolução começa, semelhantes sonhos ain<strong>da</strong> não se<br />

dissiparam. O de Musquinet serve-se de uma geometria bastante<br />

pareci<strong>da</strong> com essa, mas a meticulosi<strong>da</strong>de de seus símbolos é ain<strong>da</strong><br />

mais rica. Fortaleza de quatro lados. Ca<strong>da</strong> uma <strong>da</strong>s construções, por<br />

sua vez, tem quatro an<strong>da</strong>res, formando uma pirâmide de trabalho.<br />

Pirâmide arquitetural: <strong>na</strong> parte de baixo, as profissões dos tecelãos e<br />

dos car<strong>da</strong>dores; <strong>na</strong> parte de cima<br />

se fará uma plataforma que servirá de lugar para tramar as correntes, antes<br />

de pôr as peças <strong>na</strong>s ofici<strong>na</strong>s 18 .<br />

Pirâmide social: os internos são agrupados em batalhões de 12<br />

pessoas, sob a direção de um contramestre. Vigilantes controlam seu<br />

trabalho. Um diretor preside a tudo. Hierarquia, enfim, dos méritos,<br />

que culmi<strong>na</strong> <strong>na</strong> libertação: to<strong>da</strong> sema<strong>na</strong>, o mais esforçado dos<br />

trabalhadores "receberá do senhor presidente um prêmio de seis<br />

libras, e aquele que ganhar esse prêmio por três vezes conseguirá a<br />

liber<strong>da</strong>de" 19. Esse é o quadro do trabalho e do interesse; o equilíbrio<br />

se dá num ponto justo: o trabalho do interno é valor mercantil para a<br />

administração e tem, para o prisioneiro, valor de compra de sua<br />

liber<strong>da</strong>de: um único produto e dois sistemas de ganho. Mas há<br />

também o mundo <strong>da</strong> morali<strong>da</strong>de, simbolizado pela capela, que deve<br />

situar-se no centro do quadrado formado pelas construções. Homens<br />

e mulheres deverão assistir à missa todos os domingos, e prestar<br />

atenção ao sermão,<br />

que terá sempre por objeto provocar-lhes o arrependimento de suas vi<strong>da</strong>s<br />

passa<strong>da</strong>s, fazendo-os compreender como a liberti<strong>na</strong>gem e a ociosi<strong>da</strong>de<br />

tor<strong>na</strong>m os homens infelizes, mesmo nesta vi<strong>da</strong>... e fazê-los resolver assumir<br />

um comportamento melhor no futuro 20 .<br />

17 BRISSOT DE WARVILLE, loc. cit., pp. 183-185. Deve-se ressaltar que Sade<br />

escreveu ou projetou escrever «uma dissertação sobre a pe<strong>na</strong> de morte,<br />

segui<strong>da</strong> de um projeto sobre o emprego dos criminosos para conservá-los<br />

úteis ao Estado («Portefeuille d'un homme de lettres», cit. in G. LÉLY, Vie du<br />

marquis de Sade, II, p. 343).<br />

18 MUSQUINET DE LA PAGNE, Bicêtre réformé, ou l'établissement d'une maison de<br />

discipline, Paris, 1790, pp. 10-11.<br />

19 Idem, ibid., p. 26.<br />

20 Idem, ibid., p. 27.<br />

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