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A história da loucura na idade clássica

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se ler nos registros de Charenton uma menção como a seguinte, a<br />

respeito de um certo Claude Barbin:<br />

Ele me pareceu mais extravagante do que no ano passado...; entretanto,<br />

parece que seu espírito ain<strong>da</strong> balança entre o furor e a imbecili<strong>da</strong>de 21 .<br />

Do lado do furor, há to<strong>da</strong>s as violências exerci<strong>da</strong>s sobre os<br />

outros, to<strong>da</strong>s as ameaças de morte, essa raiva que chega ao ponto<br />

de voltar-se contra a própria pessoa: a respeito de uma mulher, uma<br />

certa Gohart, d'Argenson observa:<br />

Sua <strong>loucura</strong>... freqüentemente chega ao furor e... aparentemente a levará a<br />

desfazer-se de seu marido ou a matar a si mesma <strong>na</strong> primeira ocasião 22 .<br />

Também a imbecili<strong>da</strong>de comporta perigos mortais, mas sob<br />

outra forma: o imbecil não pode assegurar sua existência nem<br />

responder por ela: entrega-se passivamente à morte — que não é<br />

mais violência, porém pura e simples incapaci<strong>da</strong>de de subsistir por si<br />

só (a recusa em alimentar-se é considera<strong>da</strong> como o indício mais<br />

manifesto <strong>da</strong> imbecili<strong>da</strong>de). A <strong>loucura</strong> se situa e oscila entre esses<br />

dois pontos em que culmi<strong>na</strong>. A única classificação que existe é em<br />

relação a essa dupla urgência. Acima de tudo, o inter<strong>na</strong>mento<br />

distingue <strong>na</strong> <strong>loucura</strong> os perigos de morte que ela comporta: é a<br />

morte que faz a divisão, e não a razão, nem a <strong>na</strong>tureza. Todo o resto<br />

é ain<strong>da</strong>, ape<strong>na</strong>s, o grande formigamento individual <strong>da</strong>s faltas e dos<br />

defeitos. esse o primeiro esforço para uma organização do mundo<br />

dos asilos para a <strong>loucura</strong>, e seu prestígio permanecerá bem grande<br />

até o fim do século XVIII, a ponto de Tenon admiti-lo ain<strong>da</strong> como<br />

inteiramente váli<strong>da</strong>, <strong>na</strong> medi<strong>da</strong> em que dita os imperativos <strong>da</strong><br />

coerção:<br />

Os loucos distinguem-se em imbecis e furiosos; uns e outros exigem uma<br />

vigilância contínua 23 .<br />

Mas a partir dessa organização rudimentar <strong>na</strong> qual ape<strong>na</strong>s o<br />

21 Clairambault, 985, p. 349. Cf. também Pierre Dugnet: «Sua <strong>loucura</strong> continua, e<br />

é mais imbecili<strong>da</strong>de do que furor». (ibid., p. 134). Ou Michel Ambroise de<br />

Lantivy: «Sua <strong>loucura</strong> parece mais desarranjo e imbecili<strong>da</strong>de do que<br />

obsti<strong>na</strong>ção e furor» (Clairambault, 986, p. 104).<br />

22 Notas de R. d'Argenson, p. 93. Cf. igualmente: «O denomi<strong>na</strong>do l'Amoureux é<br />

uma espécie de furioso capaz de matar seus pais e vingar-se ao preço de sua<br />

morte. Participou de to<strong>da</strong>s as rebeliões que ocorreram no hospital e<br />

representou importante papel <strong>na</strong>quela em que, infelizmente, o brigadeiro dos<br />

arqueiros foi morto» (ibid., p. 66).<br />

23 TENON, «Projet du rapport sur les hôpitaux civils», Papiers sur les hôpitaux II,<br />

1. 228.<br />

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