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Fenomenologia da Percepção - Charlezine

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o CORPO 269<br />

<strong>da</strong>de", "sexuali<strong>da</strong>de" — percebo que essas "funções" não<br />

podem estar liga<strong>da</strong>s entre si e ao mundo exterior por relações<br />

de causali<strong>da</strong>de, to<strong>da</strong>s elas estão confusamente retoma<strong>da</strong>s<br />

e implica<strong>da</strong>s em um drama único. Portanto, o corpo não<br />

é um objeto. Pela mesma razão, a consciência que tenho dele<br />

não é um pensamento, quer dizer, não posso decompô-lo e<br />

recompô-lo para formar dele uma idéia clara. Sua uni<strong>da</strong>de<br />

é sempre implícita e confusa. Ele é sempre outra coisa que<br />

aquilo que ele é, sempre sexuali<strong>da</strong>de ao mesmo tempo que<br />

liber<strong>da</strong>de, enraizado na natureza no próprio momento em que<br />

se transforma pela cultura, nunca fechado em si mesmo e nunca<br />

ultrapassado. Quer se trate do corpo do outro ou de meu<br />

próprio corpo, não tenho outro meio de conhecer o corpo humano<br />

senão vivê-lo, quer dizer, retomar por minha conta o<br />

drama que o transpassa e confundir-me com ele. Portanto,<br />

sou meu corpo, exatamente na medi<strong>da</strong> em que tenho um saber<br />

adquirido e, reciprocamente, meu corpo é como um sujeito<br />

natural, como um esboço provisório de meu ser total.<br />

Assim, a experiência do corpo próprio opõe-se ao movimento<br />

reflexivo que destaca o objeto do sujeito e o sujeito do objeto,<br />

e que nos dá apenas o pensamento do corpo ou o corpo<br />

em idéia, e não a experiência do corpo ou o corpo em reali<strong>da</strong>de.<br />

Descartes o sabia muito bem, já que uma célebre carta<br />

a Elisabeth distingue o corpo tal como ele é concebido pelo<br />

uso <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> do corpo tal como ele é concebido pelo entendimento<br />

40 . Mas em Descartes esse singular saber que temos de<br />

nosso corpo apenas pelo fato de que somos um corpo permanece<br />

subordinado ao conhecimento por idéias porque, atrás<br />

do homem tal como de fato ele é, encontra-se Deus enquanto<br />

autor racional de nossa situação de fato. Apoiado nessa garantia<br />

transcendente, Descartes pode aceitar calmamente nossa<br />

condição irracional: não cabe a nós sustentar a razão e,<br />

uma vez que a reconhecemos no fundo <strong>da</strong>s coisas, resta-nos<br />

apenas agir e pensar no mundo 41 . Mas, se nossa união com

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