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Fenomenologia da Percepção - Charlezine

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O MUNDO PERCEBIDO 313<br />

oferece sempre como transcendente, é por isso que a síntese<br />

parece fazer-se no próprio objeto, no mundo, e não neste ponto<br />

metafísico que é o sujeito pensante, é nisso que a síntese<br />

perceptiva se distingue <strong>da</strong> síntese intelectual. Quando passo<br />

<strong>da</strong> diplopia à visão normal, não tenho consciência apenas de<br />

ver pelos dois olhos o mesmo objeto, tenho consciência de progredir<br />

para o objeto ele mesmo e de ter enfim a sua presença<br />

carnal. As imagens monoculares erravam vagamente diante<br />

<strong>da</strong>s coisas, elas não tinham lugar no mundo, e repentinamente<br />

elas se retiram para um certo lugar do mundo e ali são traga<strong>da</strong>s,<br />

assim como os fantasmas, à luz do dia, voltam para a<br />

fissura <strong>da</strong> terra de onde tinham saído. O objeto binocular absorve<br />

as imagens monoculares, e é nele que se faz a síntese,<br />

é em sua clareza que elas enfim se reconhecem como aparências<br />

desse objeto. A série de minhas experiências apresentase<br />

como concor<strong>da</strong>nte e a síntese tem lugar não enquanto elas<br />

exprimem to<strong>da</strong>s um certo invariante e na identi<strong>da</strong>de do objeto,<br />

mas enquanto elas são to<strong>da</strong>s recolhi<strong>da</strong>s pela última delas<br />

e na ipsei<strong>da</strong>de <strong>da</strong> coisa. Bem entendido, a ipsei<strong>da</strong>de nunca<br />

é atingi<strong>da</strong>: ca<strong>da</strong> aspecto <strong>da</strong> coisa que cai sob nossa percepção<br />

é novamente apenas um convite a perceber para além e<br />

uma para<strong>da</strong> momentânea no processo perceptivo. Se a coisa<br />

mesma fosse atingi<strong>da</strong>, doravante ela estaria exposta diante<br />

de nós e sem mistério. Ela deixaria de existir como coisa no<br />

momento mesmo em que acreditaríamos possuí-la. Portanto,<br />

o que faz a "reali<strong>da</strong>de" <strong>da</strong> coisa é justamente aquilo que<br />

a subtrai à nossa posse. A asei<strong>da</strong>de <strong>da</strong> coisa, sua presença<br />

irrecusável, e a ausência perpétua na qual ela se entrincheira<br />

são dois aspectos inseparáveis <strong>da</strong> transcendência. O intelectualismo<br />

ignora um e outro, e, se queremos <strong>da</strong>r conta <strong>da</strong> coisa<br />

enquanto termo transcendente de uma série aberta de experiências,<br />

é preciso atribuir ao sujeito <strong>da</strong> percepção a própria<br />

uni<strong>da</strong>de aberta e indefini<strong>da</strong> do esquema corporal. Eis<br />

o que nos ensina a síntese <strong>da</strong> visão binocular. Apliquemo-lo

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