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Fenomenologia da Percepção - Charlezine

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452 FENOMENOLOGIA DA PERCEPÇÃO<br />

sado tal como ele foi. O conhecimento nunca pode ultrapassar<br />

este limite <strong>da</strong> factici<strong>da</strong>de. Isso é ver<strong>da</strong>de, mas não deve<br />

servir para justificar as construções arbitrárias. É ver<strong>da</strong>de que<br />

não se falaria de na<strong>da</strong> se só se devesse falar <strong>da</strong>s experiências<br />

com as quais se coincide, já que a fala já é uma separação.<br />

Mais ain<strong>da</strong>, não existe experiência sem fala, o puro vivido<br />

não está nem mesmo na vi<strong>da</strong> falante do homem. Mas o sentido<br />

primeiro <strong>da</strong> fala está to<strong>da</strong>via nesse texto de experiência<br />

que ela tenta proferir. O que se busca não é uma coincidência<br />

quimérica de mim com outrem, do eu presente com seu<br />

passado, do médico com o doente; nós não podemos assumir<br />

a situação de outrem, reviver o passado em sua reali<strong>da</strong>de,<br />

a doença tal como ela é vivi<strong>da</strong> pelo doente. A consciência<br />

de outrem, o passado, a doença nunca se reduzem, em sua<br />

existência, àquilo que deles conheço. Mas minha própria consciência,<br />

enquanto ela existe e se engaja, também não se reduz<br />

àquilo que dela conheço. Se o filósofo causa alucinações<br />

a si mesmo por meio de uma injeção de mescalina, ou ele<br />

cede ao impulso alucinatório, e então ele viverá a alucinação,<br />

não a conhecerá, ou conserva algo de seu poder reflexivo<br />

e sempre se poderá recusar seu testemunho, que não é<br />

o mesmo de um alucinado "envolvido" na alucinação. Portanto,<br />

não existe privilégio do conhecimento de si, e outrem<br />

não me é mais impenetrável do que eu mesmo. O que é <strong>da</strong>do<br />

não é o eu e, por outro lado, outrem, meu presente e, por<br />

outro lado, meu passado, a consciência sã com seu cogito e,<br />

por outro lado, a consciência alucina<strong>da</strong>, somente a primeira<br />

sendo juiz <strong>da</strong> segun<strong>da</strong> e estando reduzi<strong>da</strong>, naquilo que concerne<br />

a esta, às suas conjecturas internas — o que é <strong>da</strong>do<br />

é o médico com o doente, eu com outrem, meu passado no horizonte<br />

de meu presente. Deformo meu passado evocando-o no<br />

presente, mas posso levar em conta essas mesmas deformações,<br />

elas me são indica<strong>da</strong>s pela tensão que subsiste entre o<br />

passado abolido que viso e minhas interpretações arbitrárias.

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