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Fenomenologia da Percepção - Charlezine

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O SER-PARA-SI E O SER-NO-MUNDO 535<br />

mente constatados. Como Montaigne o viu muito bem, ain<strong>da</strong><br />

se pode questionar esse pensamento todo carregado de sedimentos<br />

históricos e sobrecarregado com seu próprio ser,<br />

pode-se duvi<strong>da</strong>r <strong>da</strong> própria dúvi<strong>da</strong>, considera<strong>da</strong> como mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>de<br />

defini<strong>da</strong> do pensamento e como consciência de um<br />

objeto duvidoso, e a fórmula <strong>da</strong> reflexão radical não é: "na<strong>da</strong><br />

sei" — fórmula que é muito fácil de pegar em flagrante<br />

delito de contradição —, mas "que sei?" Descartes não a esqueceu.<br />

Freqüentemente honram-no por ter ultrapassado a<br />

dúvi<strong>da</strong> cética, que é apenas um estado, fazendo <strong>da</strong> dúvi<strong>da</strong><br />

um método, um ato, e por ter assim encontrado para a consciência<br />

um ponto fixo e ter restaurado a certeza. Mas, na ver<strong>da</strong>de,<br />

Descartes não fez a dúvi<strong>da</strong> cessar diante <strong>da</strong> certeza <strong>da</strong><br />

própria dúvi<strong>da</strong>, como se o ato de duvi<strong>da</strong>r bastasse para obliterar<br />

a dúvi<strong>da</strong> e trouxesse a certeza. Ele a conduziu mais longe.<br />

Ele não diz "eu duvido, eu sou", mas "eu penso, eu sou",<br />

e isso significa que a própria dúvi<strong>da</strong> é certa, não como dúvi<strong>da</strong><br />

efetiva, mas como simples pensamento de duvi<strong>da</strong>r e, já<br />

que se poderia dizer a mesma coisa desse pensamento por sua<br />

vez, a única proposição absolutamente certa e diante <strong>da</strong> qual<br />

a dúvi<strong>da</strong> se detém porque esta proposição está implica<strong>da</strong> pela<br />

dúvi<strong>da</strong> é: "eu penso", ou, ain<strong>da</strong>, "algo me aparece". Não<br />

há nenhum ato, nenhuma experiência particular que preencha<br />

exatamente minha consciência e aprisione minha liber<strong>da</strong>de,<br />

"não há pensamento que extermine o poder de pensar<br />

e o conclua — uma certa posição <strong>da</strong> lingüeta que feche definitivamente<br />

a fechadura. Não, não há pensamento que seja<br />

para o pensamento uma resolução nasci<strong>da</strong> de seu próprio desenvolvimento,<br />

e como um acordo final dessa dissonância permanente"<br />

34 . Nenhum pensamento particular nos atinge no<br />

interior de nosso pensamento, ele não é concebível sem um<br />

outro pensamento possível que seja seu testemunho. E isso<br />

não é uma imperfeição <strong>da</strong> qual se possa imaginar a consciência<br />

liberta. Justamente se deve haver consciência, se algo de-

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