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Fenomenologia da Percepção - Charlezine

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O SER-PARA-SI E O SER-NO-MUNDO 565<br />

antecipa a si mesmo. Todo mundo fala do tempo, e não como<br />

o zoólogo fala do cão ou do cavalo, no sentido de um nome<br />

coletivo, mas no sentido de um nome próprio. Por vezes,<br />

até o personificam. Todo mundo pensa que ali existe um único<br />

ser concreto, presente por inteiro em ca<strong>da</strong> uma de suas manifestações,<br />

assim como um homem está em ca<strong>da</strong> uma de suas<br />

falas. Diz-se que existe um tempo, assim como se diz que existe<br />

um jato d'água: a água mu<strong>da</strong> e o jato d'água permanece<br />

porque a forma se conserva: a forma se conserva porque ca<strong>da</strong><br />

on<strong>da</strong> sucessiva retoma as funções <strong>da</strong> precedente: on<strong>da</strong> impelente<br />

em relação àquela que impelia, ela se torna, por sua<br />

vez, on<strong>da</strong> impeli<strong>da</strong> em relação a uma outra; e enfim exatamente<br />

isso provém do fato de que, desde a fonte até o jato,<br />

as on<strong>da</strong>s não são separa<strong>da</strong>s: há um só ímpeto, uma única lacuna<br />

no fluxo bastaria para romper o jato. E aqui que se justifica<br />

a metáfora do rio, não enquanto o rio se escoa, mas enquanto<br />

ele permanece um e o mesmo. Mas esta intuição <strong>da</strong><br />

permanência do tempo está comprometi<strong>da</strong> no senso comum,<br />

porque ele o tematiza ou o objetiva, o que é justamente a maneira<br />

mais segura de ignorá-lo. Há mais ver<strong>da</strong>de nas personificações<br />

míticas do tempo do que na noção do tempo considerado,<br />

à maneira científica, como uma variável <strong>da</strong> natureza<br />

em si ou, à maneira kantiana, como uma forma idealmente<br />

separável de sua matéria. Há um estilo temporal do mundo,<br />

e o tempo permanece o mesmo porque o passado é um antigo<br />

porvir e um presente recente, o presente é um passado próximo<br />

e um porvir recente, o porvir enfim é um presente e<br />

até mesmo um passado por vir, quer dizer, porque ca<strong>da</strong> dimensão<br />

do tempo é trata<strong>da</strong> ou visa<strong>da</strong> como outra coisa que<br />

não ela mesma — quer dizer, enfim, porque no âmago do<br />

tempo existe um olhar ou, como diz Heidegger, um Augenblick,<br />

alguém por quem a palavra como possa ter um sentido.<br />

Nós não dizemos que o tempo é para alguém: isso seria<br />

estendê-lo ou imobilizá-lo novamente. Dizemos que o tempo

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