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Fenomenologia da Percepção - Charlezine

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340 FENOMENOLOGIA DA PERCEPÇÃO<br />

cama e vejo através dos olhos de um espectador situado em<br />

seu pé. Se o espetáculo se prolonga, repentinamente ele mu<strong>da</strong><br />

de aspecto: o rosto torna-se monstruoso, suas expressões<br />

horríveis, os cflios, as sobrancelhas adquirem um ar de materiali<strong>da</strong>de<br />

que nunca vi neles. Pela primeira vez ver<strong>da</strong>deiramente<br />

vejo esse rosto invertido como se essa fosse sua postura<br />

"natural": tenho diante de mim uma cabeça pontu<strong>da</strong> e<br />

sem cabelos, que traz na sua fronte um orifício sanguinolento<br />

e cheio de dentes, com dois globos móveis envoltos de crinas<br />

brilhantes e sublinhados por escovas duras, no lugar <strong>da</strong><br />

boca. Sem dúvi<strong>da</strong>, dir-se-á que o rosto "direito" é, entre todos<br />

os aspectos possíveis de um rosto, aquele que mais freqüentemente<br />

me é <strong>da</strong>do, e que o rosto invertido me espanta<br />

porque só o vejo raramente. Mas os rostos não se oferecem<br />

freqüentemente em posição rigorosamente vertical, não há nenhum<br />

privüégio estatístico a favor do rosto "direito", e a questão<br />

é justamente saber por que, nessas condições, ele me é<br />

<strong>da</strong>do mais freqüentemente que um outro. Se se admite que,<br />

por razões de simetria, minha percepção lhe atribui um privilégio<br />

e se refere a ele como a uma norma, perguntar-se-á<br />

por que, para além de uma certa obliqüi<strong>da</strong>de, o "endireitamento"<br />

não se opera. E preciso que meu olhar, que percorre<br />

o rosto e tem suas direções de movimento favoritas, só reconheça<br />

o rosto se encontra seus detalhes em uma certa ordem<br />

irreversível, é preciso que o próprio sentido do objeto — aqui<br />

o rosto e suas expressões — esteja ligado à sua orientação,<br />

como o mostra suficientemente a dupla acepção <strong>da</strong> palavra<br />

"sentido". Inverter o objeto é retirar-lhe sua significação. Portanto,<br />

seu ser objeto não é um ser-para-o-sujeito-pensante,<br />

mas um ser-para-o-olhar que o encontra sob um certo viés<br />

e, de outra maneira, não o reconhece. É por isso que ca<strong>da</strong><br />

objeto tem "seu" alto e "seu" baixo, que indicam, para um<br />

<strong>da</strong>do nível, seu lugar "natural", aquele que ele "deve" ocupar.<br />

Ver um rosto não é formar a idéia de uma certa lei de

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