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Fenomenologia da Percepção - Charlezine

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522 FENOMENOLOGIA DA PERCEPÇÃO<br />

de idéia está necessariamente ligado a um ato de expressão<br />

e lhe deve sua aparência de autonomia. Ela é um objeto cultural,<br />

como a igreja, a rua, o lápis ou a IX Sinfonia. Responder-se-á<br />

que a igreja pode incendiar-se, a rua e o lápis<br />

podem ser destruídos, e que, se to<strong>da</strong>s as partituras <strong>da</strong> IX Sinfonia<br />

e todos os instrumentos de música fossem reduzidos a<br />

cinzas, ela só existiria por breves anos na memória <strong>da</strong>queles<br />

que a tivessem ouvido, enquanto, ao contrário, a idéia do<br />

triângulo e suas proprie<strong>da</strong>des são imperecíveis. Na reali<strong>da</strong>de,<br />

a idéia do triângulo com suas proprie<strong>da</strong>des, a idéia <strong>da</strong><br />

equação de segundo grau têm sua área histórica e geográfica,<br />

e, se a tradição <strong>da</strong> qual nós as recebemos, se os instrumentos<br />

culturais que as veiculam fossem destruídos, seriam<br />

necessários novos atos de expressão criadora para vazê-las aparecer<br />

no mundo. O que é ver<strong>da</strong>deiro é apenas que, uma vez<br />

<strong>da</strong><strong>da</strong> a aparição inicial, as "aparições" ulteriores não acrescentam<br />

na<strong>da</strong>, se são bem-sucedi<strong>da</strong>s, e não subtraem na<strong>da</strong>,<br />

se são defeituosas, à equação de segundo grau, que permanece<br />

entre nós como um bem inesgotável. Mas pode-se dizer<br />

o mesmo <strong>da</strong> IX Sinfonia, que subsiste em seu lugar inteligível,<br />

como o disse Proust, que ela seja bem ou mal executa<strong>da</strong>,<br />

ou antes que leva sua existência em um tempo mais secreto<br />

que o tempo natural. O tempo <strong>da</strong>s idéias não se confunde<br />

com aquele em que os livros aparecem e desaparecem, em<br />

que as músicas são grava<strong>da</strong>s ou se apagam: um livro que sempre<br />

foi reimpresso um dia deixa de ser lido, uma música <strong>da</strong><br />

qual só restavam alguns exemplares repentinamente é procura<strong>da</strong>,<br />

a existência <strong>da</strong> idéia não se confunde com a existência<br />

empírica dos meios de expressão, mas as idéias duram ou<br />

passam, o céu inteligível mu<strong>da</strong> para uma outra cor. Nós já<br />

distinguimos entre a fala empírica, a palavra enquanto fenômeno<br />

sonoro, o fato de que tal palavra seja dita em tal momento<br />

por tal pessoa, que pode produzir-se sem pensamento<br />

— e a fala transcendental ou autêntica, aquela pela qual uma

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