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Fenomenologia da Percepção - Charlezine

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O SER-PARA-SI E O SER-NO-MUNDO 595<br />

e por conseguinte me sinto como um estrangeiro em minha<br />

usina, em minha nação, e em minha vi<strong>da</strong>. Tenho o hábito<br />

de levar em conta um fatum que não respeito, mas que é preciso<br />

preparar. Ou então: trabalho como diarista, não tenho<br />

terra nem mesmo instrumentos de trabalho, vou de fazen<strong>da</strong><br />

em fazen<strong>da</strong> alugar-me na época <strong>da</strong>s colheitas, sinto acima de<br />

mim uma potência sem nome que me torna nômade, mesmo<br />

quando eu gostaria de me fixar. Ou enfim: sou meeiro de uma<br />

fazen<strong>da</strong> onde o proprietário não instalou eletrici<strong>da</strong>de, embora<br />

a rede elétrica se encontre a menos de duzentos metros.<br />

Para mim e para minha família só disponho de um único cômodo<br />

habitável, embora fosse fácil arrumar outros quartos<br />

na casa. Meus companheiros de usina ou de colheita ou os<br />

outros meeiros fazem o mesmo trabalho que eu em condições<br />

análogas, coexistimos na mesma situação e nos sentimos semelhantes,<br />

não por alguma comparação, como se em primeiro<br />

lugar ca<strong>da</strong> um vivesse em si, mas a partir de nossas tarefas<br />

e de nossos gestos. Essas situações não supõem nenhuma avaliação<br />

expressa, e, se há uma avaliação tácita, ela é o ímpeto<br />

de uma liber<strong>da</strong>de sem projeto contra os obstáculos desconhecidos,<br />

em nenhum caso pode-se falar de uma escolha, nos três<br />

casos basta que eu tenha nascido e que eu exista para experimentar<br />

minha vi<strong>da</strong> como difícil e oprimi<strong>da</strong>, e eu não escolhi<br />

fazê-lo. Mas as coisas podem ficar assim, sem que eu passe<br />

à consciência de classe, sem que eu me compreen<strong>da</strong> como proletário<br />

e sem que eu me torne revolucionário. Então como<br />

se fará a passagem? O operário fica sabendo que, após uma<br />

greve, outros operários em um outro emprego obtiveram um<br />

aumento de salários, e observa que a seguir os salários são<br />

aumentados em sua própria usina. O fatum com o qual ele<br />

estava às voltas começa a se precisar. O diarista que não viu<br />

operários com freqüência, que não se assemelha a eles e que<br />

nem mesmo gosta deles, vê aumentar o preço dos objetos fabricados<br />

e o custo de vi<strong>da</strong>, e constata que não se pode mais

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