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Fenomenologia da Percepção - Charlezine

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586 FENOMENOLOGIA DA PERCEPÇÃO<br />

poderia engajar-se assim: ela sabe muito bem que o instante<br />

seguinte a encontrará, de qualquer maneira, igualmente livre,<br />

igualmente pouco fixa<strong>da</strong>. A própria noção de liber<strong>da</strong>de<br />

exige que nossa decisão se entranhe no porvir, que algo tenha<br />

sido feito por ela, que o instante seguinte se beneficie do<br />

precedente e, sem ser necessitado, seja pelo menos solicitado<br />

por este. Se a liber<strong>da</strong>de é liber<strong>da</strong>de de fazer, é preciso que<br />

aquilo que ela faz não seja desfeito em segui<strong>da</strong> por uma liber<strong>da</strong>de<br />

nova. Portanto, é preciso que ca<strong>da</strong> instante não seja<br />

um mundo fechado, é preciso que um instante possa envolver<br />

os seguintes, é preciso que, uma vez toma<strong>da</strong> a decisão<br />

e inicia<strong>da</strong> a ação, eu disponha de um saber adquirido, eu me<br />

beneficie de meu élan, eu esteja inclinado a continuar, é preciso<br />

que exista uma propensão do espírito. Era Descartes<br />

quem dizia que a conservação exige um poder tão grande<br />

quanto a criação, e isso supõe uma noção realista do instante.<br />

É ver<strong>da</strong>de que o instante não é uma ficção dos filósofos.<br />

Ele é o ponto em que um projeto se acaba e um outro<br />

começa 3 — aquele em que meu olhar se transla<strong>da</strong> de um fim<br />

em direção a um outro, ele é o Augen-Blick. Mas justamente<br />

esta ruptura no tempo só pode aparecer se pelo menos ca<strong>da</strong><br />

um dos dois pe<strong>da</strong>ços forma um bloco. A consciência, diz-se,<br />

não está despe<strong>da</strong>ça<strong>da</strong> em uma poeira de instantes, mas é pelo<br />

menos persegui<strong>da</strong> pelo espectro do instante que continuamente<br />

ela precisa exorcizar por um ato de liber<strong>da</strong>de. Veremos<br />

<strong>da</strong>qui a pouco que, com efeito, sempre temos o poder<br />

de interromper, mas em todo caso ele supõe um poder de começar,<br />

não haveria arrancamento se a liber<strong>da</strong>de não se tivesse<br />

investido em parte alguma e não se preparasse para fixarse<br />

alhures. Se não há ciclos de conduta, situações abertas que<br />

pedem um certo acabamento e que possam servir de fundo,<br />

seja a uma decisão que as confirme, seja a uma decisão que<br />

as transforme, a liber<strong>da</strong>de nunca tem lugar. A escolha do caráter<br />

inteligível não está excluí<strong>da</strong> apenas porque não existe

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