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GRECO, Rogério - Curso de Direito Penal Vol. 3

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RoGÉRIO GRECO VOLUME 111

"Um indivíduo, inculcando-se assassino profissional,

ardilosamente obtém de outro certa quantia para matar um

seu inimigo, sem que jamais tivesse o propósito de executar o

crime: um falso vendedor de produtos fa rmacêuticos impinge,

por bom preço, a uma fa iseuse d'anges, como eficiência

abortiva, substâncias inócuas; a cafetina recebe dinheiro do

velho libertino, prometendo levar-lhe à alcova uma virgem,

quando na realidade o que lhe vem a proporcionar é uma

jovem meretriz; o simulado falsário capta o dinheiro de

outrem, a pretexto de futura entrega de cédulas falsas ou em

troca de máquina para fabricá-las, vindo a verificar-se que

aquelas não existem ou esta não passa de um truque (conto da

guitarra); o vigarista consegue trocar por bom dinheiro o paco

que o otário julga conter uma fortuna, de que se vai locupletar

à custa da ingenuidade daquele; o cliente da prostituta não lhe

paga o pretium carnis, tendo ocultado não dispor de dinheiro

para fazê-lo". 22

Entendemos que, nesses casos, não seria possível a punição do agente pelo

crime de estelionato, sob pena de incorrermos em absurdos jurídicos. Assim,

por exemplo, somente ficaria livre da punição pelo estelionato o agente que, no

exemplo fornecido por Hungria, viesse, efetivamente, a matar a pessoa para qual

havia sido contratado ou que fornecesse a substância efetivamente abortiva etc.

Se o próprio Direito Civil não se ocupa dessas questões que envolvem a

torpeza da suposta vítima, conforme se verifica pela leitura do citado art. 883,

que dirá o Direito Penal!

Ainda seguindo as lições de Hungria,

"o patrimônio individual cuja lesão fraudulenta constitui o

estelionato é o juridicamente protegido, e somente goza da

proteção do direito o patrimônio que serve a um fim legítimo,

dentro de sua função econômico-social. Desde o momento que

ele é aplicado a um fim ilícito ou imoral, a lei, que é a expressão

do direito como mínimo ético indispensável ao convívio social,

retira-lhe o arrimo, pois, de outro modo, estaria faltando a sua

própria finalidade".23

Dessa forma, filiamo-nos à posição assumida por um dos maiores penalistas

que nosso país já conheceu.

No entanto, a posição hoje majoritária entende pela existência do delito de

estelionato, não importando a má-fé do ofendido, ou sej a, se a sua finalidade

também era torpe (ilegal, imoral etc.). Fernando Capez, adepto dessa segunda

HUNGRIA, Nélson. Comentários ao código penal, v. VII, p. 192.

HUNGRIA, Nélson. Comentários ao código penal, v. VII, p. 192-193.

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