20.05.2020 Views

GRECO, Rogério - Curso de Direito Penal Vol. 3

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

ESTUPRO CAPÍTULO 49

parte do "jogo de sedução" poderá alegar o erro de tipo, afastando-se o dolo e,

consequentemente, a tipicidade do fato.

Nesse sentido, afirma João Mestiere:

"A crença, sincera, de que a vítima apresenta oposição ao

congresso carnal apenas por recato ou para tornar o jogo do

amor mais difícil ou interessante (vis haud ingrata) deve sempre

de ser entendida em favor do agente. Falha o tipo subjetivo,

igualmente, quando o agente erra, ainda que culposamente,

sobre um dos elementos do tipo objetivo. É o erro de tipo.''24

No entanto, se a dúvida pender para o lado da negação do consentimento, a

alegação de erro de tipo não poderá ser sustentada como um simples artifício

legal para que a responsabilidade penal do agente seja afastada, haja vista

que, sendo aceita a tese do erro de tipo, mesmo que inescusável, tendo em

vista a ausência de previsão para a modalidade culposa de estupro, o fato será

considerado atípico.

Embora tenhamos exemplificado com uma possibilidade de erro sobre os

fatos que antecederam a prática do ato sexual, não significa que, em virtude de

ter a vítima correspondido sexualmente de alguma fo rma com o agente, isso

permitirá que este chegue ao ato culminante da conjunção carnal. A vítima tem o

direito de dizer não, e sua negativa deve ser compreendida pelo agente, mesmo

que em momentos anteriores houvesse alguma cumplicidade entre eles.

No caso Mike Tyson e Desiree Washington, ocorrido em 1991, nos Estados Unidos,

algumas testemunhas, que não chegaram a ser ouvidas em juízo, presenciaram a

vítima entrando volitivamente na limousine do conhecido boxeador, afirmando,

até mesmo, que os viram se abraçar e se beijar no interior do veículo. A defesa,

com base nesses fatos, tentou a anulação do julgamento sob o argumento de que

tais testemunhas teriam o condão de comprovar que a vítima, desde o começo,

consentira no ato sexual. No entanto, rechaçando essa argumentação, o Tribunal

de Apelação confirmou a condenação, sob o seguinte fundamento:

"Uma crença honesta e razoável em que um membro do sexo

contrário consentirá com a conduta sexual em algum momento

futuro não é uma escusa para o estupro ou a conduta criminal

desviada. O único consentimento válido é o consentimento

que precede de maneira imediata o da conduta sexual''.25

Isso quer dizer que a vítima, mesmo dando mostras anteriores que desejava

o ato sexual, pode modificar sua vontade a qualquer tempo, antes da penetração,

por exemplo. Somente o consentimento que precede imediatamente o ato sexual,

como esclareceu o Tribunal norte-americano, é que deve ser considerado.

MESTIERE, João. Do delito de estupro, p. 92.

Apud FLETCHER, George. P. Las víctímas ante e/ jurado, p. 170.

483

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!