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II Simpósio- artigos agrupados Editado ate pagina 1035

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que de felicidade e sem se olhar. Clara se deixava guiar, percebendo<br />

vagamente o gramado, os canteiros, cheirando um ar de rio que crescia à<br />

frente. O florista estava num lado da praça, e ele parou na frente do cesto<br />

apoiado em cavaletes e escolheu dois ramos de amor-perfeito. Deu um a<br />

Clara, depois lhe pediu que segurasse os dois enquanto puxava a carteira e<br />

pagava. Mas quando continuaram andando (ele não voltou a pegá-la pelo<br />

braço) cada um levava o seu ramo, cada um com o seu e estava contente.<br />

(CORTAZAR, 2016, pg.57)<br />

Ao final do conto, o medo pelo rechaço toma um fator decisivo na história.<br />

A pressão contínua dos olhares dos passageiros, assim como as constantes investidas do<br />

motorista em agredir Clara e o rapaz ganha corpo ao fim do conto, quando ambos<br />

adquirem seus ramos de flores.<br />

Tais fatores nos levam a reflexão sobre uma possível redenção dos dois ao<br />

que estaria acontecendo e a fobia das represálias que causavam inquietação e pavor,<br />

assim como a perda da fr<strong>ate</strong>rnidade que ascendera no instante em que Clara teria<br />

percebido que ambos estavam sem flores e isso que se fazia o fator dos olhares de<br />

reprovação.<br />

Há uma perspectiva de reprovação ao rompimento das tradições ou a algo<br />

que já se fazia devidamente aceito e legitimado por uma maioria, um costume visto que<br />

Cortázar faz um apontamento através da fala de Clara em que o sábado se constituiria<br />

como um dia de visitas ao cemitério. O respeito ao que se fazia superior sem ser ao<br />

menos questionado: Por quê levar flores ao cemitério todos naquele mesmo dia? Por<br />

que seriam reprovados aqueles que não seguissem tal pratica?<br />

Aponta-se outra questão que indiretamente se faz trabalhadano conto que<br />

seria um terror onipresente demarcado pela vigilância e pelo controle dos olhares<br />

daqueles que os rodeiam, onde muitas vezes esses podem se demonstrar como sensores<br />

de uma represália. Assim, esse controle que estabelece o terror social deveria <strong>ate</strong>nder a<br />

demanda do bem-estar social, como aponta a filósofa Hannah Arendt em Origens do<br />

Totalitarismo.<br />

O terror, como execução da lei de um movimento cujo fim ulterior não é o<br />

bem-estar dos homens nem o interesse de um homem, mas a fabricação da<br />

humanidade elimina os indivíduos pelo bem da espécie, sacrifica as “partes”<br />

em benefício do “todo”. (ARENDT, 1989, pg. 517)<br />

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