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Poderá fazer ler o texto completo deste livro - Um Jurista ao Vento

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Com efeito, neste problema, e atento o seu muito particular melindre ético, além do seu carácter<br />

verdadeiramente humano-trágico (sobre o verdadeiro sentido do trágico, veja-se a LOGOS, citada na<br />

bibliografia anexa, Volume 5, 1992, págs.262-266), o Estado não deve ter competência/legitimidade<br />

(auctoritas) para se pronunciar e intervir, seja pela via da sua legalidade formal abstracta (quer<br />

«incriminando», quer «excluindo formalmente a ilicitude»), seja pela via judicial-penal (condenando e<br />

punindo), antes de decorrido um certo «tempo razoável» de gravidez da mulher e antes de cada<br />

proble-ma concreto estar suficientemente «avançado» e ter configuradas, em cada caso, aquela<br />

«maturação» e «objectividade» que permitam assumi-lo, num plano «objectivo», em termos jurídicos<br />

e legais — tempo a determinar consoante o consenso comunitário geral que se apure, seja pela via<br />

parlamentar, seja pela via referendária (todavia, quanto às inconveniências e «efeitos perversos» do<br />

referendo, para a solução desta como de outras problemáticas, uma vez que ele «... combina mal com<br />

sistemas políticos pluralistas e com leis eleitorais de tipo proporcional», veja-se o interessante artigo de<br />

opinião de JOAQUIM AGUIAR, intitulado Perigos do Referendo, no semanário Expresso de 4 de Abril<br />

de 1998, pág. 23), e que é, actualmente, em Portugal, de 10 a 12 semanas: prazo que, contudo, tem um<br />

inequívoco e decisivo funda-mento biológico, designadamente, a passagem do embrião a feto.<br />

Antes de decorrido esse tempo, deve demarcar-se um decisivo limite negativo à competência/legiti-<br />

midade de intervenção do Estado, seja pela via da sua legalidade formal, seja pela via da apreciação<br />

judicial-criminal dos casos concretos — sendo que, os tribunais, de resto, pelo princípio da legalidade<br />

criminal, na sua vertente de nulla pœna, nullum crimen, sine lege, só poderiam apreciar casos<br />

tipificadamente considerados como ilícito penal por via dessa legalidade criminal estabelecida, a partir<br />

desse tempo em diante, com excepção ainda dos remanescentes eventuais casos em que, também<br />

tipicamen-te, fosse ainda «excluída formalmente a ilicitude».<br />

O que quer dizer que a Lei que regulasse este problema deveria ser omissa e silenciosa quanto <strong>ao</strong><br />

tempo decorrido antes desse limite, só começando a desenvolver as suas «incriminações típicas» e as<br />

suas «causas de exclusão de ilicitude» para lá de e depois de decorrido essse «tempo mínimo».<br />

Mas isto não quer dizer que o problema deixasse de ser jurídico e, até mesmo, eventualmente justiciável<br />

— embora não penalmente justiciável, como vimos, antes de decorrido certo tempo de gravidez da<br />

mulher, por implicação do princípio da «legalidade criminal».<br />

Esta tese — que defendemos desde, pelo menos, 1989 (nosso trabalho intitulado O aborto e o direito à<br />

vida: sugestão para uma reformulação normativa, não publicado, mas onde o problema era por nós<br />

perspectivado apenas em sede legislativa, numa revisão da Lei nº. 6/84, de 11 de Maio) — não exclui,<br />

como é óbvio, que, em termos práticos, as mulheres que tivessem razões para interromper<br />

voluntariamente a gravidez, durante o tempo em que o Estado não as pudesse formalmente<br />

proibir disso, na sua qualidade de legislador, ou julgá-las, na sua qualidade de juíz, o fizessem<br />

efectivamente nos «serviços públicos de saúde», uma vez que, nestes, o Estado se apresenta, não<br />

como legislador, nem como juíz, mas como mero «prestador de serviços», e, portanto, de algum modo<br />

eticamente indiferente <strong>ao</strong> cerne do problema concreto de que se trata.<br />

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